Great Scott #84: Quem é o primeiro Presidente da República a ver o dérbi Benfica-Sporting?
Manuel Teixeira Gomes
Estamos no dia 13 de Abril de 1924, joga-se a 8.ª (e última) jornada do Regional de Lisboa. O palco é o Campo Grande, mais conhecido por Estância de Madeira (onde é agora a bancada nascente do José Alvalade).
As equipas entram em campo. O Sporting com Cipriano Santos; Ferreira e Jorge Vieira; Leandro, Filipe dos Santos e Portela; Torres Pereira, Jaime Gonçalves, Alfredo dos Santos, João Francisco e Ramos. O Benfica responde com Vieira; Pimenta e Alberto Augusto; Fernando Jesus, Vítor Gonçalves e Manuel Crespo; Ribeiro, Simões, Jesus Crespo, Figueiredo e João Morais.
E o árbitro? Sente-se e delicie-se. Chama-se Tavares Bastos e é um jogador do FC Porto. Primeiro avançado, depois defesa. Isso mesmo, um portista dos sete costados (tetracampeão do Regional do Porto e vencedor do primeiro Campeonato de Portugal, precursor da Taça de Portugal, em 1922, curiosamente frente ao Sporting, numa emocionante finalíssima no Bessa).
Rezam as crónicas que Tavares Bastos é um homem dedicado à causa do futebol. Gosta de jogar, só pensa naquilo. Na bola. Natural da Madalena (Vila Nova de Gaia), começa no Espinho e depois transfere-se para o Porto, onde faz uma carreira exemplar com títulos nas quatro épocas. Fora do campo é alegre e muito comunicativo. E também árbitro. Atenção, é costume os jogadores apitarem jogos – basta relembrar o caso do primeiro árbitro português num jogo internacional, um tal Jorge Vieira (capitão do Sporting) no Espanha-Bélgica de 1921.
José Tavares Bastos é só mais um. Mas um só mais um especialíssimo. Afinal não é para todos apitar um dérbi. E como jogador do FC Porto, então, é inédito. Pitoresco, seja. O dia amanhece com o empate do Casa Pia com o Império (1-1) num “jogo emocionante, espectaculoso mas fraquinho esse futebol de puzzle – cortado, torcido, enovelado”, descreve o “Diário de Lisboa” com alguma (muita) piada.
Com o empate do Casa Pia (10 pontos), o Benfica (9) está obrigado a ganhar para se sagrar campeão. Já fora das contas, o Sporting (7) joga tão-só pelo prestígio. E dá-se bem, com os golos de Jaime, João Francisco e João Francisco (sim, é um bis deste jovem, que gosta mesmo é de correr; daí o título de campeão nacional de atletismo na estafeta 4x100m).
Três-zero para o Sporting, o título de campeão para o Casa Pia e o árbitro do FCP? “Muito infeliz”, classifica o “Diário de Lisboa”. O que acontece então? O dérbi seguinte é apitado por Ilídio Nogueira, sócio do Benfica (3-2 para o Sporting).
Calma, muita calma. Esse Sporting-Benfica com o árbitro do FC Porto ainda tem um outro pormenor: é o primeiro dérbi visto in loco por um Presidente da República – e o sétimo da nossa história: Manuel Teixeira Gomes. Entra de fininho na segunda parte e entrega a taça de campeão ao Casa Pia.