Great Scott #581: Último jogador impedido pelo Partido Comunista de jogar no FC Porto?

Great Scott Mais 07/11/2022
Tovar FC

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Great Scott #581: Último jogador impedido pelo Partido Comunista de jogar no FC Porto?

Emil Spassov

A Bulgária caminha para um futuro radioso. A nova geração de jogadores irradia classe por todo o campo e há recursos humanos para dar que falar. Que o diga a qualificação para o Mundial-86: num grupo com França, Jugoslávia, RDA e Luxemburgo, o passaporte para o México é selado a uma jornada do fim, em Setembro 1985.

Ligeiramente antes, o Levski sagra-se campeão búlgaro e o CSKA vencedor da Taça Militar. Para acabar a época desportiva em beleza, só falta a final da Taça da Bulgária entre os rivais de Sofia. A data já está marcada há muito (19 Junho), o estádio idem idem (Nacional). Senhoras e senhores, start your engines.

O Levski joga com Mihailov (futuro Belenenses), Antoni Zdravkov (Marítimo, Nacional, Benfica Castelo Branco), Petrov (Beira-Mar) e mais oito. O CSKA responde com Bezinski (Portimonense), Radoslav Zdravkov (Chaves, Braga, Paços, Felgueiras), Voynov (Portimonense, Estoril, Estrela), Slavkov (Chaves) e Tanev (Chaves). O dérbi é quente, sempre. Este ainda mais, porque o Levski acumula uma sequência de sete vitórias seguidas. Sete, não façam confusão.

O CSKA entra cheio de vontade de interromper a série e marca primeiro, por Slavkov (26’). Dito assim, nada mais a acrescentar. Só que Slavkov ajeita a bola com a mão antes de entrar na área. O gesto paralisa Iliev (o seu marcador directo) e Mihailov (guarda-redes). O árbitro nem ai nem ui, Slvakov segue com a bola e atira a contar. Nos festejos, o herói provoca os adeptos com gestos. Beeeeem, está montada uma triste barraca – até porque o jogo é rodeado de segurança extra pelos recentes e trágicos acontecimentos na final da Taça dos Campeões entre Liverpool e Juventus no Heysel.

Na segunda parte, o 2:0 também é polémico pela falta assim-assim sobre Markov à entrada da área do Levski. Os protestos voam, há palavras e empurrões, pobre árbitro. Do respectivo livre directo, Voynov mete a bola na gaveta. Vai buscar. No quadradinho seguinte, Voynov volta a estar no centro das atenções com uma queda na área do Levski. O árbitro nem hesita, penálti. Mihailov passa-se dos carretos e empurra-o duas vezes. Ostensivamente. É demais, e nem amarelo vê. Acto contínuo, ainda nervoso com toda a certeza, Mihailov defende o remate de Slavkov e adia o 3:0.

A ira está em campo, Nikolov agride Slavkov e depois ainda acerta duro em Zdravkov. É expulso com verdade directo, enquanto Zdravkov é levado para o hospital. O assunto piora ainda mais o ambiente e, junto à linha lateral, Spasov e Yanchev esgrimem argumentos. Primeiro com a bola, depois sem ela. Spasov, completamente transtornado, aperta o pescoço de Yanchev. Toda a Bulgária vê. Um jovem Stoitchkov intromete-se e caus, Velev, Nikolova ainda mais confusão, gere-se mais uma batalha campal. O árbitro expulsa Yanchev e Spasov.

Ainda faltam uns 20 minutos e o dérbi já está todo partido. Sirakov ainda reduz, de penálti, e é tudo. Acaba 2:1 para o CSKA. Mal apita para o fim, o árbitro é insultado e agredido por uma série de enfurecidos jogadores do Levski, como Mihailov (ainda e sempre) mais Sirakov. Neste clima de puro terror, o capitão Dimitrov levanta a taça como se nada fosse. A caminho do balneário, mais problemas, mais insultos, mais empurrões, mais tudo. Uma vergonha completa.

Quarenta e oito horas depois, no dia 21, o presidente do Comité Central do Partido Comunista, diz de sua justiça. E que justiça, chi-ça, Todor Zhivkov arrasa com o futebol: Levski e CSKA dissolvidos, Levski sem título de campeão búlgaro 1985 nem direito a participar na Taça dos Campeões, CSKA sem título da Taça da Bulgária nem direito a entrar na Taça das Taças, os presidentes dos respectivos clubes excluídos dos cargos, tal como os treinadores Manolov e Metodiev, mais ainda alguns jogadores como Stoitchkov, Spasov, Nikolov, Velev – já Sirakov só apanha um ano de suspensão.

E agora? O CSKA vira Sredets, o Levski é renomeado Vitosha, e ambos sem platel para grandes voos. Disso se aproveita o Beroe para se sagrar campeão búlgaro em 1986 – ainda hoje é o único da sua história num plantel com Lipenski (Olhanense), Kashmer (Portimonense, Quarteirense) e Dragolov (Torreense). Nesse ano em curso, e com o Mundial do México tão perto, o Comité Central decide reduzir as penas dos jogadores.

Seja como for, o comboio da fama já pertence ao passado para alguns desses castigados. O caso mais flagrante é o de Emil Spasov. O avançado é expulso pela primeira vez na carreira e apanha por tabela. Tudo isto três dias depois depois de assinar pelo FC Porto. Ya, acreditem. O homem assina pelo FC Porto e vê-se obrigado a hibernar. Quando volta ao activo, assina pelo IK Brage (Suécia) em 1986 e, depois, joga pelo Antuérpia em 1986-87, precisamente no ano em que o FC Porto é campeão europeu.

Outro prejudicado é Nikolov, Plamen Nikolov, um defesa robusto, eleito o melhor búlgaro do ano em 1984. Também ele está de olho no FC Porto. Se Spasov já tem tudo assinado, Nikolov ainda não se pode dar ao luxo de festejar a transferência para Portugal à falta de uns pormenores. A expulsão na final por atropelar Slavkov e, depois, Radi afastam-no do mundo da bola por um tempo. Quando regressa, faz o mesmo percurso de Spasov. Coincidência? I think not.

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