Great Scott #506: Única equipa algarvia na final de um campeonato de jovens?

Great Scott Mais 03/28/2022
Tovar FC

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Great Scott #506: Única equipa algarvia na final de um campeonato de jovens?

Louletano

Corre o ano 1977 e estamos em Junho. A notícia desportiva do momento é uma nota do Ministério dos Negócios Estrangeiros a apressar os naturais das ex-colónias a definirem, de uma vez por todas, a sua nacionalidade: ou se preferem continuar do seu país ou se querem passar a portugueses? A pergunta é lógica e pertinente, porque a 1.ª divisão 1977-78 arranca daí a momentos e a federação só aceita um estrangeiro por equipa. O Benfica, por exemplo, acumula quatro estrangeiros entre Alhinho, Shéu, Alberto e Cavungi. O Sporting, dois (Manaca e Jordão). O FC Porto, outros dois (Freitas e Seninho). E por aí fora. Ao todo, há 22 jogadores nessa situação.

Fora isso, o país futebolístico surpreende-se com a presença de uma equipa algarvia na final do campeonato nacional de iniciados. A proeza é do Louletano, cujo presidente João Simões tem 36 anos e o treinador Tó Viegas tão-só 25. Mas como? O Louletano dobra o cabo das tormentas e acaba em primeiro lugar no grupo da zona sul, à frente de Sporting, Belenenses e União de Coimbra. Todo um feito grandioso em cima de condições inenarráveis e misturado com um discurso prá frentex.

Diz o presidente, industrial de tipografia. ‘Entendemos que o Louletano deveria transformar-se numa colectividade ao serviço do homem, não apenas físico, mas também intelectual. Por esse prisma, orientámos os nossos esforços ao longo destes dois anos de actividade directiva. Reconhecemos que tínhamos de acabar com a mentira. Logo, se o ciclismo é rico, mas tal como é praticado, destrói o homem e dá-lhe uma perpsectiva errada do desportivo, tivemos de pôr de parte essa modalidade. Avançámos no amadorismo, todos os nossos atletas o são em absoluto. E esta é a primeira vitória da verdade.’

Para chegar à final, o Louletano passa muito mal. Diz Tó Viegas. ‘Passámos quase toda a época a treinar na Escola Secundária em Loulé num recinto mal iluminado e piso alcatroado. Treinávamos com bolas de borracha. Só há dois meses é que passámos a treinar num campo de futebol a sério, no Estádio Campina, das 21 às 23 horas. Quando passámos à fase final, também íamos à Quinta do Lago e treinávamos nos campos de golfe. Só na semana da final é que fomos treinar no Estádio São Luís, em Faro.’ E os jogos do Louletano, onde? Tapadinha, em Lisboa. E com botas emprestadas por outros clubes, como o Vitória FC (Setúbal) e o Futebol Clube de São Luís (Faro).

A final é precisamente na Tapadinha, domingo, dia 10 Julho. Apita Nemésio de Castro. O FC Porto é o vencedor incontestável da zona norte, só com vitórias e sem qualquer golo sofrido (18:0). O Louletano esgrime argumentos com o Sporting à porta da última jornada. O favoritismo recai sobre o Sporting, naturalmente. O problema é o resto, o jogo jogado. Pois é, o União Coimbra surpreende o Sporting por 1:0 e o Louletano apura-se para a final com um empate no Restelo.

A vitória portista é indiscutível, José Augusto faz o 1:0 na primeira parte e fabrica o 2:0 de Quinito na segunda. A festa, essa, é algarvia. Os adeptos do Louletano entram em campo de forma pacífica e abraçam os seus jogadores. Juntos, dão uma volta à Tapadinha com as bandeiras desfraldadas numa imagem de rara beleza. E, já agora, compromisso com a cidade de Loulé, onde o futebol-distracção é uma realidade assente com os pés no chão.

Curiosidade, o Porto conquista o título em dia de aniversário de um tal Jaime, médio direito. Ora bem, é o Jaime Magalhães, nascido a 10 Junho 1962. Nesse dia, celebra 15 anos e joga os 90 minutos. A propósito, eis as equipas.

FC Porto Vítor; Henrique; Nelo, Horácio e Bandeirinha; Jaime, Félix, Quinito e Jesus; João e José Augusto

Suplentes não utilizados Cunha, Vale, Maurício, Fernando e Rodrigues

Treinador Acácio Carneiro

Louletano João Francisco; Vítor; Carlos José (Hélder, 45), David e Domingos; Aragão (Florêncio, 45), Henrique, Carminho e Delfim; Carlos e Américo (Óscar, 59)

Suplentes não utilizados Sérgio e Carlinhos

Treinador António Viegas

Marcadores 1:0 José Augusto (30); 2:0 Quinito (48)

Para a história, seguem os nomes completos dos 18 heróis imortais do Louletano, cinco dos quais com Guerreiro no apelido

Guarda-redes

João Francisco Madeira Viegas (natural de Loulé)

Sérgio José Jacinto Fernandes (Loulé)

Defesas

Carlos José Barradas Silvestre (Loulé)

Hélio Caliço Viegas (Loulé)

Vítor Manuel Alves de Sousa (Loulé)

Domingos da Rocha Leite Martins (Arouca)

Óscar Manuel Gonçalves Dias (Loulé)

Nuno José Romeiras Louro (Loulé)

Médios

Rui Manuel Fonseca Aragão (Loulé)

Henrique Gravato Rodrigues (Maputo, Moçambique)

Delfim Correia Serafim Baptista (Loulé)

Rui Manuel Brito Carminho (Loulé)

Carlos Luís Santos Martins (Loulé)

Avançados

Carlos Manuel Roca Guerreiro (Moçamedes, Angola)

David Algada Guerreiro (Maracay, Venezuela)

Florêncio de Sousa Guerreiro (Loulé)

Américo Manuel Martins da Ponte (Loulé)

Hélder Martinho Gonçalves Guerreiro (Loulé)

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