Great Scott #106: Quem é o único a jogar em Portugal na colecção Panini do Euro-88?
Rijkaard
O Euro-88 é uma delícia. Ganha a Holanda e tudo. No ataque, Gullit e Van Basten. Ambos do Milan. No meio, Rijkaard. Do Sporting. Errrrrr.
Acto i, 26 Fevereiro 1986
Frank Rijkaard é capaz de ser o jogador mais importante da história do Sporting sem nunca o ter sido. Sim, sem nunca ter vestido a camisola verde e branca nem sequer jogado em Alvalade (a não ser em 1994, pelo Ajax, num particular de apresentação aos sócios). O holandês é um sonho de Jorge Gonçalves. Ex-campeão nacional de vela e homem de negócios, o presidente do Sporting quer arranjar as unhas do leão. Como tal, quer contratar os melhores para Alvalade. A sua primeira opção é Rijkaard. A 26 de Fevereiro, o jovem de 19 anos chega a Lisboa para visitar o Estádio José Alvalade, passear por Lisboa, conhecer alguns jogadores e comer um linguado, com o conhecimento de John Cruijff, seu treinador no Ajax
Acto ii, 29 Outubro 1987
Na ressaca da visita a Lisboa para conhecer Alvalade, o holandês regressa a Lisboa, novamente a convite de Jorge Gonçalves, presidente leonino. Nesse dia, Rijkaard entra em Alvalade, vê o treino do Sporting (que perdera 2:1 dois dias antes vs Varzim), conhece o treinador inglês Keith Burkinshaw e dá uma entrevista em que dá conta da insatisfação de continuar a trabalhar sob as ordens de Cruijff, seu treinador no Ajax, com quem tem um desentendimento irreversível. Está, portanto, tudo bem encaminhado para o negócio se concretizar, mas o Ajax chama-o de urgência a Amesterdão. É preciso paciência.
Acto iii, 11 Fevereiro 1988
Aí está a primeira unha do leão. Jorge Gonçalves apresenta Rijkaard em Alvalade, confirmado o negócio com o Ajax. Sem dinheiro para pagar a totalidade da transferência, o Sporting pede ajuda ao grupo multinacional Ecofinance, que desembolsa os 284 700 contos que faltam para completar a mudança de ares do médio. Em ano de Europeu de selecções, o holandês quer recuperar o tempo perdido no banco do Ajax desde o início de época e diz-se preparado fisicamente para jogar no campeonato português. O problema é que o prazo de inscrição para jogadores já terminara. O caso passa para o Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol, o famoso CJ da FPF. A ver. Seja como for, Rijkaard vai de fato e gravata ao Estádio José Alvalade e vê in loco o insosso empate vs Espinho, na companhia da sua mulher. Só para a estatística, o onze de António Morais inclui Rui Correia; João Luís I, Morato, Venâncio (cap.) Fernando Mendes; Oceano; Sealy, Litos, Mário Jorge e Silvinho; Paulinho Cascavel.
Acto iv, 25 Fevereiro 1988
O Conselho de Justiça da federação portuguesa impede Rijkaard de jogar em Portugal, por atraso na inscrição, e o holandês entra em depressão: “Por favor, deixem-me jogar.” Em Espanha, as leis de transferência são diferentes das de Portugal e o Saragoça, equipa no meio da tabela, contrata o médio para o resto da época. Mas o último treino de Rijkaard em Lisboa é azarado e ele sai lesionado. Chegado a Espanha, o drama de Frank é assim sintetizado: não joga na Holanda (por imposição de Cruijff, com quem se zanga durante um treino), não joga em Portugal (inscrição tardia), não joga em Itália (onde o querem – Milan e Juventus – e também por atraso na inscrição) e não joga em Espanha (por lesão). Acaba aqui? Nem por sombras, falta uma historieta.
Acto v, 1 Maio 1988 Fim do folhetim. Para sempre. Falta um mês do Europeu, que consagraria Rijkaard não só como campeão mas também como o terceiro melhor jogador do mundo, conforme a votação dos jornalistas de toda a Europa no prémio Bola de Ouro da “France Football”. Feitas as contas, o Sporting encaixa bom dinheiro com um jogador que nunca vestiu oficialmente a camisola leonina. Não se sabe bem ao certo: 115 ou 155 mil contos. Depende da fatia que é de Jorge Gonçalves, o presidente. “Foi um bom golo”, desabafa Amado de Freitas, dirigente do Sporting, após a venda do passe de Rijkaard para o Milan. The end? Sim, o fim.
