#7 Milan 1993-94

Mais Spider Pig 12/18/2020
Tovar FC

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#7 Milan 1993-94

As invenções de Berlusconi resultam sempre – as invenções futebolísticas, diga-se em abono da verdade, para evitar mal-entendidos. Silvio compra o Milan em 1986 e injecta dinheiro, tanto em jogadores como treinadores.

O primeiro é Arrigo Sacchi, um jovem de 41 anos, com carreira nos juniores de Bellaria, Cesena, Rimini e Fiorentina mais os seniores do Parma. É aqui que elimina o Milan na Taça de Itália e atrai as atenções de Berlusconi. Com os reforços holandeses Rijkaard, Gullit e Van Basten mais os italianos Baresi e Donadoni, o bom do Sacchi ganha de 1987 a 1991 qualquer coisa como oito títulos, dos quais seis internacionais. A táctica é simples: pressão alta.

O goleador Van Basten é o primeiro defesa, o capitão Baresi é o polícia sinaleiro. Quando ele levanta o braço, o árbitro assinala fora-de-jogo automaticamente. A maior parte das vezes, com razão. O Milan é o rei de Itália (um scudetto), da Europa (duas Taças dos Campeões, uma delas ao Benfica, e duas Supertaças europeias) e do Mundo (duas Taças Intercontinentais). Na época 1990-91, Sacchi e o plantel já estão cansados de ganhar, se é que se pode falar/escrever assim. A equipa não funciona, o fora-de-jogo idem idem, os problemas aspas aspas. Sacchi torna-se persona non grata para alguns jogadores, como Van Basten.

Ao mesmo tempo que o Milan perde o campeonato para a Sampdoria, a Taça de Itália para a Juventus e é desqualificado da Taça dos Campeões por se recusar a jogar os últimos sete minutos em Marselha, depois de um black-out no Velódrome, a selecção italiana falha o apuramento para o Euro-92. Nessa altura a federação contacta Sacchi e oferece-lhe o cargo de seleccionador.

Em Maio 1991, Sacchi abandona o Milan e Berlusconi procura um sucessor. Em vez de o procurar em Itália ou no estrangeiro, Silvio encontra-o em casa – Milanello, centro de estágio do Milan. Chama-se Fabio Capello, o homem. Treinador das reservas, depois nos seniores, durante cinco jogos em 1986-87, na transição Liedholm-Sacchi, é então um discreto dirigente da secção de hóquei. Incrível, e verídico. Berlusconi contrata-o para treinador principal e Capello impõe o seu estilo. Na primeira conferência de imprensa, a 2 Agosto 1991, Fabio fala bem. “Olá, muito boa tarde. Quero só dizer que é impossível imitar Sacchi mas o meu Milan não vai jogar em linha, não vai jogar a pensar no fora-de-jogo. Quero um futebol de ataque, fluido e ganhador. Quero um futebol de golos e espectáculo.” Uiii, em Itália?

Sim, em Itália. Na época de estreia (1991-92), o Milan volta aos títulos de campeão italiano, e invicto. Isso mesmo, sem derrotas. Em 34 jornadas, 22 vitórias e 12 empates com 74 golos marcados e 21 sofridos. Na última ronda, em Foggia, o recorde da invencibilidade está em risco. Ao intervalo, vantagem do Foggia por 2:1. Baaaaaaah, o Milan dá a volta. E dá a volta com estrondo, 7:0 na segunda parte. Acaba 8:2. Com bis de Van Basten, o melhor marcador da Serie A, com 25 golos.

O estatuto de invencível só acaba em Março 1993, com um golo de Asprilla em pleno Giuseppe Meazza. O Parma ganha 1:0, o Milan estaciona nos 58 jogos sem perder. Como qualquer equipa, há que levantar e dar a cara por outro recorde. Capello é adepto desse sistema. Sempre sem pressão alta nem fora-de-jogo, só estilo, muito estilo. O que dizer então do título de campeão italiano em 1993-94, com 36 golos em 34 jogos? Das 18 equipas, só sete marcam menos.

Jamais visto, nunca mais repetido. Óbvio. O Milan Capello 3.0 é uma caricatura do original, só que ganha ganha ganha e ganha – além do campeonato, a Supertaça italiana (1:0 vs Torino, em Washington) e a Taça dos Campeões (4:0 vs Barcelona, em Atenas). Também perde, atenção. Falamos da Taça Intercontinental para o São Paulo e a Supertaça europeia para o Parma.

Concentremo-nos então no campeonato. A escassez de golos é acompanhada pelo número absurdo de 12 empates, com oito 0:0 (há ali uma sequência de três seguidos em Janeiro, madre mía). No mês seguinte, em Fevereiro, o guarda-redes Sebastiano Rossi crava um recorde nacional de imbatibilidade em 929 minutos, à frente dos 903’ de Zoff (Juventus) estabelecido em 1973. A epopeia do campeão mais burocrático da história reúne outro elemento contranatura, o das zero vitórias nas últimas seis jornadas. Zero. Nem um para amostra. Repetimo-nos, não? É melhor, é: jamais visto, nunca mais repetido.

A festa do scudetto, essa, faz-se na antepenúltima ronda, com 2:2 vs Udinese em Milão, golos de Boban e Simone. Na última jornada, dia 1 Maio 1994, tristemente célebre pela morte de Ayrton Senna no GP Ímola, a aflita Reggiana ganha com um golo de Esposito no Giuseppe Meazza e salva-se in extremis da despromoção. O campeão apresenta-se com alguns suplentes, como Papin (amazing) mais Laudrup (super amazing), e paga a factura de um embaraço pouco comum.

A fragilidade exibicional dá que falar um pouco por toda a Europa. Ao ponto de Cruijff se achar favorito na final europeia em Atenas. Pois bem, o Milan aplica um correctivo inimaginável de 4:0 ao tetracampeão espanhol. Ao intervalo, o 2:0 já diz quase tudo. Bis de Massaro, o já famoso abre-latas do Milan no campeonato, com oito golos em forma de 1:0. Na final da Liga dos Campeões, é um mero pró-forma. Massaro ainda faz o 2:0 ao pobre Barça. Cabe a Savicevic (zero golos no campeonato) e Desailly (um) o prolongar da festa milanista. E milanesa – o Inter, que até escapara à 2.ª divisão por um só ponto, já se proclamara vencedor da Taça UEFA dessa época, vs Casino Salsburgo.

Eis Milão, uma cidade com queda para o pragmatismo exagerado.

(a negrito, os jogos fora)

1 Lecce                1:0          Boban

2 Genoa              1:0          Massaro

3 Piacenza          0:0

4 Atalanta           2:0          Papin Raducioiu

5 Roma                2:0          Papin Nava

6 Cremonese    2:0          Papin Simone

7 Lazio                  0:0

8 Foggia              1:1          Boban

9 Juventus         1:1          Albertini

10 Sampdoria   2:3          Albertini BLaudrup

11 Inter               2:1          Panucci Papin

12 Nápoles         2:1          Panucci Albertini

13 Parma            0:0

14 Torino            1:0          Raducioiu

15 Udinese        0:0

16 Cagliari           2:1          Massaro (2)

17 Reggiana       1:0          Desailly

18 Lecce              0:0

19 Genoa            0:0

20 Piacenza        2:0          Massaro Papin

21 Atalanta        1:0          Massaro

22 Roma              2:0          Massaro Maldini

23 Cremonese  1:0          Simone

24 Lazio               1:0          Massaro

25 Foggia            2:1          Boban Massaro

26 Juventus       1:0          Eranio

27 Sampdoria    1:0          Massaro

28 Inter                2:1          Bergomi (pb) Massaro

29 Nápoles        0:1

30 Parma            1:1          Massaro

31 Torino            0:0

32 Udinese        2:2          Boban Simone

33 Cagliari          0:0

34 Reggiana       0:1

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