#15 Kaiserslautern 1996-97-98
Quem quer ser John Malkovich, lembra-se do filme? Faço as contas à vida de Otto Rehhagel e respondo afirmativamente à pergunta do mesmo género sobre o treinador alemão. Sim, quero ser Otto. Chi-ça, que boss. Já nem falo do último título da carreira, o de campeão europeu pela Grécia em 2004, com cinco vitórias em seis jogos. Nem do primeiro, o de vencedor da Taça da Alemanha pelo Fortuna Düsseldorf em 1980, com sete vitórias em sete. Nem sequer vou abordar os 14 anos de Werder Bremen, onde levanta oito troféus (repare-se bem nesta sequência formidável para uma equipa de classe média: Taça da Alemanha 1991, Taça das Taças 1992, Bundesliga 1993, Taça da Alemanha 1994).
Nada de Grécia, nada de Fortuna, nada de Bremen, só quero ser o Otto Rehhagel do Kaiserslautern. O conto de fadas começa de forma insuspeita em Munique, no Verão 1995. O Bayern contrata-o para fugir à crise interna agravada pelo sexto lugar em 1994-95. O sucesso no Werder Bremen é uma bonita folha de serviço. Ou não. O Bayern daquele tempo é mais conhecido como FC Hollywood numa alusão à fogueira das vaidades de um plantel rico em jogadores sensacionais com personalidades tortas. Klinsmann, o reforço mais sonante, via-Tottenham, é o mais crítico em relação às considerações técnico-tácticas de Otto. Apelida-o mesmo de rural, matarruano.
No campo, o Bayern é uma manta de retalhos. Na pré-época, em Agosto, apanha 7:0 do Deportivo (hat-trick de Bebeto) num torneio em Cartagena. Em Setembro, nos dias 12 e 18, acumula duas derrotas embaraçosas. A primeira é em casa vs Lokomotiv Moscovo para a Taça UEFA (devidamente rectificada na Rússia com um sensacional 5:0), a segunda dita o adeus à Taça da Alemanha, aos pés do Fortuna. Na 1.ª divisão, tudo nos conformes com sete vitórias em outros tantos jogos e a liderança isolada. O cenário muda drasticamente de figura na segunda volta, com apenas sete vitórias em 17 jornadas. O Dortmund aproveita a deixa e sagra-se campeão. Por essa altura, já Otto está no desemprego.
Isso mesmo, é despedido a quatro dias da primeira mão da final da Taça UEFA. Quem assume o comando é o presidente Franz Beckenbauer, vencedor dos dois jogos vs Bordéus (2:0 em casa, 3:1 fora). Klinsmann acaba a época com 31 golos, 16 na Taça UEFA (um recorde da prova), seis dos quais ao Benfica. E agora, Otto? Chamam-lhe desde Kaiserslautern.
Pormenor, o K’lautern acaba de experimentar a época mais atípica dos seus 95 anos de história com a conquista da Taça da Alemanha (1:0 vs Karlsruhe) e a inédita descida à 2.ª divisão. O presidente Norbert Thines renuncia ao cargo e aparece Jürgen Friedrich, espécie de 112, já com duas experiências à frente do clube no currículo. Agora como director do conselho fiscal, é ele quem refaz a hierarquia do K’lautern e nomeia Hubert Këssler como presidente mais Hans-Peter Briegel como director-desportivo. O treinador, esse, é Otto em vez de Eckhard Krautzun, o tal do misto de emoções (descida à 2.ª e, uma semana depois, conquista da Taça).
Otto começa do zero e é eliminado à primeira nas duas competições mata-mata: Taça das Taças (Estrela Vermelha, 1:0 em casa, 0:4 fora) e Taça da Alemanha (0:1 vs Greuther Fürth). Pelo meio, deixa fugir a supertaça alemã para o Dortmund, num inacreditável desempate de penáltis em Mannheim. Ao quinto remate, há 3:0. De repente, Chapuisat 3:1, Ratinho (falha), But (3:2), Lutz (falha), Zorc (3:3). Vamos para uma segunda série. Roos (falha), Weiland (3:4). Contra todas as expectativas, o Dortmund ganha.
No inferno da 2.ª divisão, a movida é diferente. Para melhor, muito melhor. A primeira derrota só aparece à 15.ª jornada, em Mannheim (again, Mannheim), quando o avanço em relação ao segundo classificado (Hertha) já é de cinco pontos. A segunda volta é igualmente tranquila e o título festeja-se a cinco jornadas do fim com um espantoso 7:0 vs Lübeck. Os últimos dois jogos em casa rendem 12 golos a seu favor, 5:0 vs Waldhof Mannheim e 7:6 vs Meppen. Ainda hoje, esse 7:6 é o resultado mais gordo de sempre da 2. Bundesliga.
O jogo é inacreditável, quiçá a melhor maneira de sempre para fechar um título. Aos 20 minutos, 4:0. Ao intervalo, 6:2. Aos 75 minutos, 7:3. Nos últimos 15 minutos, o Meppen marca três e fixa o 7:6. Para a história, 10 marcadores para 13 golos – bis de Marschall, Riedl (ambos na primeira parte) e do visitante Clässen. O campeão da 2.ª reúne um plantel de luxo com um campeão mundial (Andreas Brehme, capitão) e dois checos presentes no Euro-96 (Kadlec e Kuka, este último o melhor marcador, com 14 golos, à frente de Rische 13 e Marschall 10).
Na época seguinte, de volta ao convívio dos grandes, o K’lautern entra em grande estilo e acumula seis vitórias nas sete primeiras jornadas. A abrir, 1:0 ao campeão Bayern em Munique, golo de Schjönberg, o central dinamarquês contratado por Krautzun, antecessor de Otto. Na semana seguinte, outro 1:0, agora ao Hertha, golo de Marschall. É ele o grande destaque dessa época, ao ponto de ter sido convocado pela selecção alemã para o Mundial-98. A seu cargo, 21 golos. Desses, cinco especiais de corrida, todos aos Borussia. O bis vs Dortmund, de 0:2 para 2:2, e o hat-trick vs M’Gladbach, de 0:2 para 3:2. Verdadeiramente impressionante, a capacidade goleadora deste avançado democrático. Proclamado campeão de inverno, o K’lautern recebe o Bayern com quatro pontos de avanço. Noventa minutos depois, já são sete (2:0). Líder isolado desde a quarta jornada, o K’lautern festeja o título a uma semana do fim, com 4:0 vs Wolfsburgo. O empate em Hamburgo é um mero pró-forma.
Contas feitas, a campanha da 1.ª divisão é igual igual igual igual à da 2.ª, com 19 vitórias, 11 empates e quatro derrotas. Uma coincidência notável a dar ainda mais ênfase à regularidade suprema de Otto Rehhagel. Na época seguinte, a estreia do K’lautern na Liga dos Campeões é vs Benfica, na Alemanhja, Decide Wagner, 1:0. As contas do grupo F decidem-se no penúltimo dia, em período de descontos, com um golo de Rische na Luz. Ganha o Benfica por 2:1 só que o golo fora garante vantagem num hipotético desempate na última jornada. Nos ¼ final, o Bayern é largamente superior com 6:0 no conjunto das duas mãos e, thats all folks, a série do ‘quem quer ser Otto Rehhagel’ vai pregar para outra freguesia.
1996-97 (a negrito, os jogos fora)
Estugarda Kickers | 2:0 | Wegmann-2 |
Carl Zeiss Jena | 2:0 | Wagner Koch |
Bayer Uerdingen | 1:0 | Wagner |
Mainz | 1:1 | Schjönberg |
Wolfsburgo | 0:0 | |
Hertha Berlim | 0:0 | |
Lokomotiv Leipzig | 2:2 | Ratinho Rische |
Unterhaching | 0:0 | |
Gütersloh | 2:0 | Reich Marschall |
Rot-Weiss Essen | 4:1 | Koch-2 Kuka Rische |
Fortuna Colónia | 0:0 | |
Oldenburg | 6:2 | Kuka-3 Marschall Wegmann Rische |
Lübeck | 2:0 | Kuka Wagner |
Zwickau | 4:1 | Marschall-2 Franck Wegmann |
Waldhof Mannheim | 0:2 | |
Eintracht Frankfurt | 5:0 | Kuka-2 Rische-2 Franck |
Meppen | 1:2 | Wagner |
Unterhaching | 0:0 | |
Estugarda Kickers | 2:0 | Rische Riedl |
Carl Zeiss Jena | 2:2 | Rufer Wagner |
Bayer Uerdingen | 3:1 | Rische Wegmann Kuka |
Mainz | 0:0 | |
Wolfsburgo | 4:0 | Rische Ratinho Rufer Riedl |
Hertha Berlim | 0:2 | |
Lokomotiv Leipzig | 4:1 | Kuka-2 Wagner Rische |
Gütersloh | 1:1 | Kuka |
Rot-Weiss Essen | 3:2 | Kuka Rufer Margref (pb) |
Fortuna Colónia | 2:0 | Wegmann Kuka |
Oldenburg | 1:0 | Kadlec |
Lübeck | 7:0 | Marschall-2 Rufer Rischer Riedl Koch Kuka |
Zwickau | 1:2 | Marschall |
Waldhof Mannheim | 5:0 | Koch-2 Wagner Marschall Rische |
Eintracht Frankfurt | 0:0 | |
Meppen | 7:6 | Marschall-2 Reisch-2 Riedl-2 Roos |
1997-98 (a negrito, os jogos fora)
Bayern | 1:0 | Schjönberg |
Hertha Berlim | 1:0 | Marschall |
Colónia | 0:0 | |
Schalke 04 | 3:0 | Marschall-2 Sforza |
Bochum | 3:1 | Kuka-2 Marschall |
Estugarda | 4:3 | Marschall-3 Ratinho |
Karlsruhe | 4:2 | Ratinho Wagner Kuka Reisch |
Werder Bremen | 1:3 | Marschall |
TSV 1860 | 3:1 | Marschall-2 Sforza |
Arminia Bielefeld | 3:1 | Rische-2 Kadlec |
Bayer Leverkusen | 1:1 | Rische |
Duisburgo | 1:0 | Marschall |
Dortmund | 2:2 | Marschall-2 |
Hansa Rostock | 4:3 | Rische-2 Sforza Schjönberg |
M’Gladbach | 3:1 | Buck Kuka Rische |
Wolfsburgo | 1:2 | Wagner |
Hamburgo | 2:1 | Ratinho Hristov |
Bayern | 2:0 | Hamann (pb) Hristov |
Hertha Berlim | 0:2 | |
Colónia | 3:2 | Hristov Riedl Schjönberg |
Schalke 04 | 1:1 | Hristov |
Bochum | 3:0 | Rische-2 Wagner |
Estugarda | 1:0 | Hristov |
Karlsruhe | 0:0 | |
Werder Bremen | 1:1 | Schjönberg |
TSV 1860 | 1:0 | Ratinho |
Bayer Leverkusen | 0:3 | |
Duisburgo | 1:1 | Marschall |
Dortmund | 1:1 | Kuka |
Hansa Rostock | 2:2 | Rische Gansauge (pb) |
M’Gladbach | 3:2 | Marschall-3 |
Arminia Bielefeld | 2:2 | Marschall Rische |
Wolfsburgo | 4:0 | Marschall-2 Wagner Rische |
Hamburgo | 1:1 | Marschall |