Monty Python, 1:0 de Sócrates
[sketch dos Monty Python, em Junho 1982; voz de John Cleese]
Muito boa tarde, cá estamos em Munique. Lotação esgotada no Olímpico para assistir a esta excitante final. E, atenção, lá vêm os alemães. São os favoritos desta tarde, embora tenham atraído as atenções da imprensa pelos problemas da equipa. Vão jogar em 4-2-4 com Leibniz na baliza, quatro defesas com Kant, Hegel, Schopenhauer e Schelling, quatro avançados com Schlegel, Wittgenstein, Nietzsche e Heidegger, apoiados pela dupla do meio-campo constituída por Beckenbauer e Jaspers. Obviamente que a surpresa aqui é a inclusão de Beckenbauer.
E agora entram em campo os gregos, liderados pelo veterano Heraclitus. Vamos dar uma olhadela à equipa. Como seria de esperar, uma postura defensiva. Platão na baliza, Sócrates no ataque e Aristóteles como libero. É, aliás, ele o jogador mais em forma. A surpresa é a titularidade de Arquimedes.
Bem, é a vez do árbitro. Confúcio e os dois fiscais-de-linha, Santo Agostinho e São Tomás de Aquino. Os dois capitães apertam as mãos e estamos prontos para o arranque da partida. Mr. Confúcio olha para a ampulheta e começa o jogo!
[os alemães viram de imediato as costas ao jogo, de mão no queixo, em profunda reflexão]
Nietzsche e Hegel estão ali. Karl Jappers, o número sete, está a andar para o lado. Wittegenstein acompanha-o. Ali está Beckenbauer. E Schelling. Heidegger na cobertura. Schopenhauer. [a câmara vira-se para o outro lado do campo, onde os gregos pensam profundamente, gesticulando aqui e ali] E agora os gregos. Epicuro. Plotino, número seis. Aristóteles. Empédocles e Demócrito com ele. Arquimedes. Sócrates. Ali está ele. Sócrates. A avançar. Perto da bola, perto da bola. Bem, voltaremos a esta estonteante partida quando ocorrer alguma coisa de interessante.
[…]
De volta ao jogo. Pode não haver golos, mas o êxtase é por demais evidente. Como podem ver, Nietzsche acabou de ser advertido por discutir com o árbitro. Ele acusou Confúcio de não ter livre arbítrio. E é o terceiro cartão de Nietzsche em quatro jogos. E quem é aquele? É Karl Marx. Karl Marx está a aquecer. Vamos ter substituição para os alemães. Obviamente, o treinador Martinho Lutero decidiu atacar, visto que faltam apenas dois minutos para o final. A pergunta é, quem será substituído, quem sairá? Pode ser Jaspers, Hegel ou Schopenhauer, mas, afinal, vai ser Wittgenstein!
E entra Marx. Veremos se ele consegue dar crédito ao ataque alemão. Evidentemente que não. Que decepção! Resta agora apenas um minuto e antevê-se o mesmo resultado do jogo da última terça-feira. Mas calma, Arquimedes tem uma ideia. Eureka! Arquimedes toca para Sócrates, Sócrates de novo para Arquimedes, Arquimedes passa para Heráclito, que por sua vez dribla Hegel. Heráclito adianta e corre. Lá está Sócrates. Sócrates de cabeça! Sócrates marca!
Os gregos enlouqueceram, os gregos enlouqueceram! Sócrates marca, recebeu um belo cruzamento de Arquimedes. Os alemães discutem. Hegel afirma que a realidade é meramente um a priori adjunto de uma ética não-naturalista, Kant via imperativo categórico defende que ontologicamente isto existe apenas na imaginação, e Marx reclama que estava em fora-de-jogo. Porém, a todos eles Confúcio responde com o apito final! Acabou! A Alemanha, que eliminou o famoso trio inglês Bentham-Locke-Hobbes na meia-final, foi derrotada por um golo. Vamos vê-lo de novo. Sócrates, Sócrates cabeceia sem hipótese para Leibnitz. E olhem para os gregos deliciados. Lá estão eles, Sófocles, Empédocles, grande jogo. Epicuro. E Sócrates, o capitão que marcou provavelmente o golo mais importante da sua carreira.