#43 Ovarense 1987-88

Mais Spider Pig 03/05/2023
Tovar FC

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#43 Ovarense 1987-88

Outubro 1987, a Ovarense organiza uma conferência de imprensa e apresenta a candidatura ao título de campeão de basquetebol. Isto é a sério, a direcção apresenta a equipa, o treinador Luís Magalhães e sonha alto naquele estilo muito descontraído ‘depois não digam que não avisámos’.

Só para situar os mais desatentos (como eu, já agora), o Benfica é o campeão em título. Aliás, é o tricampeão em título. E, aviso à navegação, o Benfica vai ganhar todos os campeonatos de 1985 a 1995, excepção feita ao de 1988. Para quem?

Ora essa. Ovarense, evidente. E num campeonato muito especial, o primeiro de sempre com play-off à melhor de três. O arranque é vistoso com três vitórias e uma média de 107 pontos, graças à dupla norte-americana Dwayne Johnson (DJ) e Ellie, ambos reforços do Verão, juntamente com Rui Chumbo (Sanjoanense), Paulo Brinca (Beira-Mar), José Monteiro ‘Borracha’ (Brasil), José da Velha (Esgueira) e Pedro Barros (FC Porto). Tudo somado entre saídas, permanências e entradas, o plantel tem uma média de 22,8 anos e 1,89 metros de altura.

No primeiro teste a sério, nas Antas, o FC Porto dá água pela barba por 102:85 e é o primeiro choque de realidade. Tranquilo, a Ovarense dá a volta ao texto na semana seguinte, com 99:98 vs. Benfica em Ovar. Nessa tarde, DJ faz 29 pontos, Ellie 28.

Na segunda volta, a Ovarense comete a proeza de derrubar o FC Porto com todo o cinco inicial a marcar 10 ou mais pontos. Ei-los: DJ 28, Ellis 27, Vítor Ferreira 27, Mário Leite 10, Borracha 10. Como em todas as histórias de encantar, há desilusões ali pelo meio como as duas derrotas seguidas, no mesmo fim-de-semana (é outra novidade deste campeonato), vs. Queluz e Estrelas da Avenida, então treinadas por Carlos Barroca. Já com o apuramento mais que garantido para a segunda fase, toma lá 100 pontos ao Sporting.

A segunda fase é só entra os seis primeiros classificados da primeira e o início é penoso, com 102:80 no Restelo. Se é verdade que Ellie (36) e DJ (32) continuam iguais a si próprios, o resto da equipa está muito aquém do esperado e acusa-se a ausência do brasileiro bom de bola chamado Borracha. Também é preciso falar dos estrangeiros do Belenense, 40 pontos para Adams e 30 para Webb.

É preciso uma reacção e a Ovarense vence o Benfica por 81:79 daí a uma semana, com 40 pontos de DJ (incrível, quase quase quase metade dos pontos). No outro lado, Lisboa faz 30 numa tarde em que o Benfica está a ganhar tranquilamente por 61:42 aos cinco minutos da segunda parte.

Segue-se o FC Porto e aparece a primeira derrota da época em casa aliada à 10.ª vitória seguida do FCP num dia em que o dérbi lisboeta se joga nas Caldas da Rainha, por interdição da nave de Alvalade, e é resolvido com dois lançamentos livres de Guimarães no último suspiro (69:68 para o Benfica).

É precisamente o Sporting a próxima vítima da Ovarense, ainda por cima na nave de Alvalade. Com 39 pontos de DJ mais 28 de Ellie e outros 14 de Rui Leitão. Nada se compara aos nove triplos de Lisboa no 79:74 do Benfica vs. Belenenses.

No fim da primeira parte, o dérbi vs. Illiabum é de sentido único e o único jogo da época em que Ellie nem chega aos dez pontos. DJ, esse, continua imparável (27). A derrota de 30 pontos em nada atrapalha os planos da equipa de Luís Magalhães. No jogo seguinte, joga-se à americana, sem qualquer cuidado defensivo e sempre de olho no cesto. Daí os 125:109 vs. Belenenses, com direito a adiamento por 24 horas para transmissão em directo na RTP.

Os próximos dois jogos significam toda uma época, com visitas à Luz e às Antas. E não é que a Ovarense dá baile com 93:82 vs. Benfica sem Lisboa a oito minutos do fim por duas faltas desnecessárias (Ellie 35, DJ 32) mais 95:74 vs. FC Porto (55:29 ao intervalo) (Ellie 37, DJ 26).

As duas últimas jornadas servem para rodar, a ideia é chegar com a cabeça limpa e o corpo são ao play-off. A ideia da federação é original, no mínimo. O primeiro da série A (do 1.º aos 6.º da primeira fase) joga com o 2.º da B (do 7.º aos 12.º). é FC Porto vs. Imortal. O 2.º (Ovarense) com o 1.º (Beira-Mar), depois o 4.º(Benfica) vs. 5.º (Illiabum) e o 3.º (Sporting) vs. 6.º (Belenenses). Que salganhada.

Adiante. É à melhor de três. A Ovarense despacha o Beira-Mar sem espinhas e apanha o Belenenses, vencedor do Sporting na negra. Na ½ final, a Ovarense domina o Belenenses com autoridade, seis pontos de avanço em Ovar (DJ 39, Ellie 29) e 15 no Restelo. É tudo tão fácil que até tem direito a uma semana de descanso, porque a outra ½ final vai ao terceiro jogo. O FC Porto ganha na Luz, o Benfica dá o troco nas Antas (32 pontos de Guimarães num 89:86). Ainda assim, a vantagem do factor casa pertence ao FC Porto.

A um minuto e 31 segundos do fim, está 84:79 para o FC Porto. Eis que o Benfica faz sete pontos seguidos e dá a volta para 84:86. Já só faltam segundos e o FC Porto falha um lançamento fácil. Guimarães ganha o ressalto, sofre falta e falha os dois lançamentos livres. Só que o Benfica recupera a bola e ainda tenta o cesto. Vale o tampão de Lee. Repete-se o cenário, é o Benfica quem recupera a bola e Lisboa gasta o tempo diminuto a fugir dos adversários.

Contra a lógica da época (o FC Porto ganha cinco dos seis clássicos dessa época), é o Benfica quem vai à decisão vs. Ovarense. A série abre em Ovar, com vitória do Benfica. Ao intervalo, 54:55 para a Ovarense. No fim, 87:87. No prolongamento, sem Lisboa, desclassificado pela quinta falta a 19 segundos do fim do tempo regulamentar, 94:99.

DJ faz 37 pontos e é o encestador da noite, bem secundado por Ellie (24) e Rui Leitão (22). Só que o cinco do Benfica faz jackpot com Henrique Vieira 26, Lisboa 22, Guimarães 27, Mike 10, Seiça 14.

O pavilhão da Luz recebe o jogo do título. Será? A Ovarense aparece com 200 adeptos e são eles quem cantam vitória. Ellie 36 e DJ 29 derrubam o Benfica, muito aquém da semana anterior à excepção de Guimarães (28) e Seiça (22). Henrique Vieira só faz oito, Mike Plowden sete e Lisboa 12. E; atemção, DJ é desclassificado aos dez minutos da segunda parte. Vale a união da Ovarense para ir à negra, em Ovar, por via da melhor classificação na primeira fase.

A emoção é ilimitada, a Ovarense está à beira do primeiro título de campeão nacional. Duas mil e 500 pessoas enchem o recinto e mais, muitas mais estacionam fora do pavilhão a curtir o ambiente. A Ovarense entra bem melhor e sai a ganhar para o intervalo por 48:41. O Benfica vai atrás da desvantagem e aproveita a expulsão de DJ à falta de 3’39’’ por agredir Guimarães. É um acto irreflectido e é também a quinta falta pessoal. Sem DJ, o Benfica agiganta-se e empata 84:84 a dois segundos pelo inevitável Lisboa. Segue-se o lançamento livre, novamente para Lisboa. A tensão é imensa, o Benfica está a poucos metros do título de campeão. Lisboa lança e falha, incrível. Os heróis também erram.

Vamos para prolongamento e aí a Ovarense é ligeiramente superior porque tira partida da exclusão de Seiça. Contas feitas, a Ovarense ganha 95:93 graças ao maior acerto nos lançamentos de campo, seja os do garrafão (55% contra 51% do Benfica), seja os triplos (44% contra 25% — só entram três de 12).

Para a história, os autores dos pontos no lendário 28 Maio 1988

Ovarense

Ellie 31, DJ 26, Borracha 14, Rui Leitão 10, Mário Leite 9, Rui Chumbo 3

Benfica

Seiça 37, Guimarães 28, Lisboa 14, Plowden 6, Henrique Vieira 5

E o futuro? A Ovarense mantém a tendência vencedora e junta Supertaça mais Taça de Portugal em 1988-89. De todos os seus integrantes, destaque para Mário Leite, um rapaz nascido e criado em Ovar — como pessoa, jogador e até treinador. E, claro, referência maiúscula para Mario Ellie, tricampeão da NBA.

Isso mesmo, Ellie sai da Ovarense em 1989 e entra na NBA em 1990, pela porta dos 76ers (1990-91). Depois Warriors (1991-92) e Blazers (1992-93). Quando assina pelos Rockets, é bicampeão em 1994 e 1995. O terceiro anel é em 1999, pelo Spurs, onde Ellie faz parte do cinco inicial em todos os 17 jogos dos play-off.

Eis a carreira mítica da Ovarense

(a negrito, os jogos fora)

Illiabum     68:67 (em Cucujães)
Esgueira 124:94
Sangalhos 120:80
FC Porto    85:102
Benfica 99:98
Belenenses 81:74
Queluz 102:93
Estrelas 92:58
Sporting     87:88
Imortal       101:85
Illiabum 75:70
Esgueira     83:86
Sangalhos   96:83
FC Porto 95:89
Beira-Mar 101:89
Benfica       84:91
Belenenses 97:93
Queluz        75:80
Estrelas      108:109
Sporting 100:76
Imortal 87:73

2.ª fase (do 1.º ao 6.º)

Belenenses 80:102
Benfica 81:79
FC Porto 84:97
Sporting     97:95
Illiabum 56:86
Belenenses 125:109
Benfica       93:82
FC Porto    95:74
Sporting 76:78
Illiabum     82:97

Play-off

Beira-Mar 102:86
Beira-Mar  98:96
Belenenses 86:80
Belenenses 100:85

Final

Benfica 94:99 ap
Benfica       85:80
Benfica 95:93 ap
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