#51 Bayern 1995-96
Que miséria, é até inqualificável. Com Trapattoni ao leme e com as contratações de Kahn, Papin e até Kostadinov no mercado de inverno, o Bayern 1994-95 perde a supertaça alemã, é eliminado à primeira na Taça da Alemanha, apanha 5 do Ajax na ½ final da Liga dos Campeões e, para cúmulo, acaba em sexto lugar, o último de acesso à Taça UEFA.
A época é má, péssima. Por isso, eleições para a presidência. Ganha Franz Beckenbauer. A primeira medida é endireitar o clube na parte desportiva. Fala ao coração de Klinsmann (e também ao do Tottenham, a troco de 1,4 milhões de euros), contrata Sforza, Herzog e Strunz, as estrelas mais cintilantes de Kaiserslautern, Werder Bremen e Estugarda. O treinador, esse, é Otto Rehhagel, uma referência incontornável do futebol alemão pelo trabalho sensacional nos últimos 14 anos no Werder Bremen.
O arranque é tudo menos promissor e o Bayern apanha sete do Deportivo, em Cartagena (Espanha). O brasileiro Bebeto faz a festa com três golos, Fran com dois, Begiristain e Aldana, um cada. Na baliza, Probst na primeira parte (3:0) e Tomic na segunda (4:0).
O sonho do campeonato é diluído pela força dominante chamada Borussia. O Bayern luta até ao fim, só que acaba a seis pontos e vergado à evidência. Só lhe resta a Taça UEFA, uma competição sem estatuto nem dimensão. Quem o diz é Beckenbauer ao longo dos anos. Pois bem, em 1995-96, o homem tem de fazer inversão de marcha e adoptar a Taça UEFA como uma competição do bem – e, já agora, por alcançar na história do Bayern, ao contrário de outros clubes alemães da classe média, como Eintracht Frankfurt e Bayer Leverkusen.
A aventura europeia do Bayern 1995-96 começa pessimamente, com uma derrota em casa vs. Lokomotiv Moscovo. Um golo de Kharlachev aos 70 minutos, numa jogada iniciada pelo guarda-redes Ovchinnikov (esse mesmo), gela ainda mais Munique. Quinze dias depois, em Moscovo, o Bayern entra mal, muito mal, e só não sofre dois golos por culpa de Kahn e nabice de Gurenko. Depois, bem depois, acorda. E com apetite. Já está 4:0 ao intervalo. O quinto da noite é de Strunz, de cabeça. E mais poderiam ser, se Kostadinov não acertasse duas bolas no poste numa noite em que a iluminação do estádio falha em dose dupla.
Segue-se o Raith Rovers, da Escócia. Na primeira mão, em Edimburgo, dois golos de Klinsmann resolvem o assunto e sentenciam a eliminatória. Ou não. Porque o Raith Rovers sai para o intervalo em Munique com a vantagem de 1:0. A incerteza dura pouco. O Bayern usufrui do factor Klinsmann, autor do 1:1. E ainda de Babbel, 2:1.
Cuidado, vem aí o Benfica de Mário Wilson. O Bayern ataca primeira a baliza de Preud’homme, com um pontapé do meio da rua de Klinsmann. O Benfica reage na mesma moeda, por Valdo. Um-um em remates por cima. E agora? Aparece o golo de Klinsmann, o primeiro de quatro nessa noite.
Ya, quatro. Jürgen faz póquer a Preud’homme com o patrocínio do central brasileiro Paulo Pereira, sobretudo no 4:1, quando levanta os braços para a bola ir em direcção ao isolado Klinsmann. Perto do fim, o suplente Kostadinov acerta uma bola belíssima à trave. Antes, muito antes, o 1:1 de Dimas é um golo irregular por falta de JVP sobre Kahn.
Na Luz, uma combinação entre Valdo e Marcelo garante a alegria do Benfica. Sol de pouca dura. Klinsmann é lançado desde o meio-campo e galopa num ritmo alucinante até ao empate, já dentro da área, com um toque de classe à saída de Preud’homme. Na segunda parte, bis de Klinsmann, bola à trave de Hassan e 1:3 de Herzog num extraordinário remate de primeira.
Calha-lhe em sorte o Nottingham Forest, grande referência do futebol inglês e até europeu dos anos 80, com Brian Clough. Agora é Frank Clark, o homem do leme. E quê? Nada, o Bayern é largamente superior. Nem tanto em Munique, mais em Nottingham. Que disparate de jogo na terra do Robin dos bosques. Ziege estende a passadeira, Klinsmann marca dois (um deles é espectacular, remate acrobático, todo no ar) e até Papin se dá ao direito de celebrar um golo, de cabeça.
O Bayern chega à ½ final e há Barcelona, Bordéus e Slavia Praga. Sai-lhe o Barcelona de Cruijff à cabeça mais Popescu, Hagi e Figo, só para citar os estrangeiros. Ainda há Bakero, Guardiola, Ferrer, Oscar. É este último quem marca o primeiro golo da eliminatória, a passe do capitão Bakero, em Munique. O Bayern dá a volta por Witeczek e Scholl, o Barcelona ganha ânimo com o 2:2 de Hagi num esplêndido pontapé dos dele.
A segunda mão é em Camp Nou e, atenção, o Bayern conta por vitórias todos os quatro jogos europeus dessa campanha com um esmagador 15:2 em golos. O Barcelona joga sem Hagi, ausência de última hora, por lesão – é Kodro quem ocupa o seu lugar. E o Bayern entra em campo sem Papin nem Matthäus. O Barcelona acabara de perder a Taça do Rei para o Atlético Madrid, golo solitário de Pantic no prolongamento, o Bayern já está a anos-luz do Borussia.
Qual das equipas reage melhor à adversidade? O Bayern, claro. Scholl dá a volta a Nadal, atira forte para defesa incompleta de Busquets e recarga vitoriosa de Babbel. O Barcelona nunca mais recuperará do golpe e o facto de acabar com Aberlardo a ponta-de-lança diz tudo sobre tudo.
Aos 83’, Figo solta-se na direita e flecte para o meio num gesto muito seu. Pisa a área e atira contra o corpo de um defesa. O ressalto vai parar aos pés de outro defesa e daí constrói-se o contra-ataque do 0:2, obra de Witeczek com a ajuda do calcanhar Nadal para trair o instinto de Busquets. Já perto do fim, De la Peña reduz e é só. Otto Rehhagel é a alegria em pessoa. Natürlich. ‘É um resultado histórico, vitória e apuramento para a final. Estamos contentes por ter neutralizado o Barcelona, uma grande equipa.’
É a última conferência de imprensa de Rehhagel na Taça UEFA. Então e a final? Pois, Beckenbauer dá um golpe de asa e substitui-o daí a duas semanas. O presidente desce de pedestal e leva a equipa ao triunfo na Taça UEFA, vs. Bordéus.
O primeiro jogo é em casa e o Bordéus joga sem as vedetas mais valiosas, ambas castigadas com cartões amarelos. Quem, quem? Zidane e Dugarry. O Bayern vê caminho aberto para ganhar vantagem, Helmer e Scholl fazem o 2:0.
Em França, outro galo cantará. O Bordéus apresenta Zidane com o número 7, Dugarry com o 11. A expectativa é muita de uma equipa sonhadora, que eliminara o Milan nos ¼ com derrota por dois em Milão e vitória por três no Parc Lescure. Insistimos, outro galo cantará. Beckenbauer, conhecedor dos truques e fintas por ter um passado como treinador do Marselha, leva cozinheiro e obriga-o a praticar catenaccio com a comida. Depois, o Bayern é superior em talento, golos e também maldade.
O capitão Lizarazu é afastado do jogo por uma entrada feiíssima de Kostadinov. O búlgaro pisa-lhe a perna num alegado lance de bola dividida, já depois de uma série de entradas impiedosas, umas com contacto, outras nem por isso. Ao intervalo, 0:0 e uma roleta formidável de Zidane junto à linha lateral.
Na segunda parte, o Bayern arranca irresistível para a vitória inequívoca por 3:1. Kostadinov assiste Scholl para o 1:0 e festeja o 2:0, de cabeça, após canto de Scholl na esquerda. O suplente Dutuel reduz, de livre directo, antes de Klinsmann fazer o 15.º golo em 12 jogos na Taça UEFA 1995-96 – só marca mais um na liga alemã em 32.
O capitão Matthäus levanta a taça, Beckenbauer volta à presidência e Trapattoni está de volta para 1996-97.
(a negrito, os jogos fora)
Lokomotiv M 0:1
Lokomotiv M 5:0 Klinsmann-2 / Herzog / Scholl / Strunz
Raith Rovers 2:0 Klinsmann-2
Raith Rovers 2:1 Klinsmann / Babbel
Benfica 4:1 Klinsmann-4
Benfica 3:1 Klinsmann-2 / Herzog
Nott Forest 2:1 Klinsmann / Scholl
Nott Forest 5:1 Klinsmann-2 / Ziege / Strunz / Papin
Barcelona 2:2 Witeczek / Scholl
Barcelona 2:1 Babbel / Witeczek
Bordéus 2:0 Helmer / Scholl
Bordéus 3:1 Scholl / Kostadinov / Klinsmann