Great Scott #375: Último jogador a marcar ao Benfica no dia seguinte ao seu casamento?
Pietra
Neves de Sousa, do “Diário de Lisboa”, abre o livro. “Cimeira de luxo na primeira lotação esgotada na história do Restelo. Dois teams de impecável fala técnica. Uma arbitragem quase magnífica. Sol a derramar-se em cornucópias de luz. O Tejo ao fundo, em cenário irreal. Seis golos empolgantes. Um dos mais soberbos desafios de futebol até hoje jogado em campeonatos da moderna idade portuguesa. Um show a que nada faltou para colocar a densa plateia em indesmentível delírio a recordar pelos tempos fora como símbolo de algo que se deseja perdure por muitos e dilatados anos.”
É isso e muito mais. É daqueles jogos para a história e um dos raros casos em que o Benfica sofre quatro golos na 1ª divisão, algo inédito nos últimos nove anos, desde 1966 (Braga). A moldura humana no Restelo é impressionante. Qualquer coisa como sessenta mil pessoas aparecem e transformam positivamente o dérbi. Em campo, duas equipas campeãs. O Benfica, da 1ª divisão. O Belenenses, da Taça Intertoto. Sim senhor, a Taça Intertoto. Na altura, a UEFA ainda não é a dona e senhora do pedaço. É só uma prova oficiosa, realizada durante a pré-época e dividida em dez grupos. Num deles (o 9), o Belenenses calha em sorte com uma equipa holandesa (FC Amesterdão), outra checoslovaca (Spartak Trnava) e mais uma dinamarquesa (FC Copenhaga). Nos seis jogos, zero derrotas mais quatro vitórias e dois empates.
O onze de Peres Bandeira está fadado para altos voos, claro está. A recepção ao Benfica comprova-o em absoluto. O espectáculo começa aos 15 minutos, com uma falta dura de Barros sobre Cardoso. Marca o livre Gonzalez. Com conta, peso e medida para a área, onde aparece a figura de Artur Jorge cuja simulação é primorosa e estende a passadeira vermelha a Pietra. O cabeceamento é fulgurante, sem dar hipótese a Bento.
No dia anterior, Pietra está num altar ao lado de Nela, a sua namorada desde os 15 anos de idade. Aos 21 decidem casar-se. E a noite de núpcias? Zero a zero. ‘O Minervas teve de entrar em estágio naquela noite de sábado e até marcou um golo no dia seguinte. Estava inspirado. Lá por o casório ter sido nas vésperas do futebol não havia motivo para ser à pressa. Calhou apenas.’
E o clássico vs Benfica? Os minutos avançam e o Belenenses falha o 2-0, por Quaresma. Seria este mesmo jogador a permitir o empate de Jordão. À porta do intervalo, canto de Gonzalez, cabeceamento-amortie de Artur Jorge e exímio pontapé de bicicleta de Vasques. O Restelo vai-se abaixo, a festa é imensa. E continua pela segunda parte dentro. Nem o 2-2 de Nené arrefece os ânimos. O Beleneses domina em toda a linha e chega novamente à vantagem, por Vasques. Como actores secundários deste filme, lá vêm outra vez Gonzalez e Artur Jorge. Como mero figurante, Bento. O pobre do Bento nem a vê passar. Em cima do minuto 90, Pietra esconde a bola de todos e galga terreno até encontrar um companheiro. Artur Jorge evita um benfiquista e atira a contar. Quatro-dois é dose. O Restelo está em festa, o Beleneses é líder por uma jornada.