Great Scott #556: Únicos treinadores irmãos a sagrarem-se campeões nacionais em países diferentes no mesmo dia?
Bob e Bill Shankly
A irmandade tem destas coisas fascinantes. A família Shankly soma cinco filhos, todos jogadores da bola. O mais conhecido é Bill, internacional escocês, capitão da Escócia e até autor de um golo vs Inglaterra a 50 metros da baliza. Como treinador, o seu nome é elevado a Deus pelos adeptos do Liverpool com um total de 15 épocas.
O seu caminho começa em 1959 e só acaba em 1974. Nesse hiato temporal, Bill ganha qualquer coisa como 10 títulos, um dos quais internacional (Taça UEFA 1973). Um ano depois, no jogo de despedida, em Wembley, perante 100 mil ruidosos adeptos, Shankly levanta a Taça de Inglaterra com um inequívoco 3:0 vs Newcastle.
Antes, muito antes, Bill é campeão da 2.ª divisão em 1962. O arranque é divinal, com dez vitórias, um empate e só quatro golos sofridos em 11 jornadas. À 12.ª, o Middlesbrough interrompe a série. Até final do ano 1961, o Liverpool acumula mais quatro derrotas e a imprensa cai em cima de Shankly, ainda e sempre líder da 2.ª divisão. No início de 1962, duas vitórias gordas mudam a estratégia de Bill.
Como? O Liverpool dá 4:3 ao Chelsea para a Taça de Inglaterra e, uma semana depois, 5:4 vs Luton Town para o campeonato. O registo de 9:7 em golos implica uma alteração no desenho táctico do Liverpool com a introdução dos laterais. Bill puxa Gerry Bryne de médio-esquerdo para defesa-direito e tira o veterano Ronnie Moran do ostracismo para defesa-esquerdo.
A partir daí, o equilíbrio é mais notório e o Liverpool voa para o título de campeão, alcançado a três jornadas do fim com um 3:2 em Plymouth, golo decisivo de Roger Hunt, melhor marcador da 2.ª divisão graças aos 41 golos (damn) (nove bis, quatro hat-tricks, duplo damn). Estamos a 28 Abril 1962, é um sábado.
Nesse mesmo dia, o Dundee FC sagra-se campeão escocês da 1.ª divisão pela única vez em toda a sua história mais-que-centenária. O treinador chama-se Bob Shankly. Nem mais, o irmão mais novo de Bill. A façanha é extraordinária em 1962, mais ainda em 2022. É o único título de campeão, sem dar cavaco ao monopólio dos clubes do costume, os da capital Celtic e Rangers. A luta pelo primeiro lugar é acérrima e só acaba no último dia, o tal 28 Abril.
Antes, dia 25, a meio da semana, realiza-se a penúltima jornada com Aberdeen vs Rangers e Dundee FC vs St Mirren (atenção, o St Mirren está aflito a fugir à despromoção mas empata vs Dundee na primeira volta e elimina-o da Taça da Escócia).
Ao intervalo, o Dundee sorri largo. Em vantagem com golo solitário de Cousin, toma conhecimento da derrota do Rangers, a quem depenara 5:1 no início da época. Na segunda parte, o árbitro Syme apita penálti para o St Mirren. Os protestos do Dundee fazem-se sentir por longos minutos e o árbitro ratifica a sua decisão com um dos fiscais-de-linha. Chamado a bater, Liney defende o remate de Clunie.
O penálti tem história por trás, porque o pai de Liney, adepto incondicional do St Mirren, havia dito ao filho na véspera que, em caso de penálti, Clunie atiraria para a direita. Meu dito, meu feito. Liney lembra-se do aviso e voa com categoria. Daí a poucos minutos, o Dundee fixa o 0:2 por Penman. No regresso ao balneário, os jogadores festejam uma espécie de 0:3 com a confirmação da derrota do Rangers em Aberdeen por 1:0.
De volta ao tal sábado, 28. Basta um ponto vs St Johnstone para selar o título de campeão escocês. Vinte mil adeptos do Dundee fazem a curta viagem de 30 km para assistir a uma página histórica, a mais bela de todas do clube. O Dundee exagera e dá três-secos, com bis de Gilzean, melhor marcador da 1.ª divisão com 27 golos.
Curiosidade maiúscula: Bert Slater, conhecido como Shorty pelos 1,73 metros de altura, sai do Liverpool de Bill Shankly como campeão da 2.ª divisão e assina pelo Dundee FC de Bob Shankly. O guarda-redes já havia sido figura destacada num particular entre os treinadores irmãos em Março 1960 para inaugurar as torres de iluminação do campo do Dundee. Quando falamos de figura destacada, falamos de um autogolo na sequência de um canto. Acaba 1:0, cortesia Slater.