Nélson. “O Roberto Carlos acertou-me em cheio e nem vi os penáltis”
É uma competição sui generis. É a única vez da Coreia unificada, com oito do Norte e dez do Sul, e é o adeus da URSS como União Soviética. Ganha Portugal, a única selecção europeia a juntar dois títulos mundiais sub20 consecutivos. Ao de 1989, o de 1991. Só há dois repetentes. Brassard é eterno suplente de Bizarro em Riade, enquanto JVP joga em ambos. Brassard é um dos heróis da final, JVP levanta a taça como capitão. Um é o número 1, o outro o 14. E o 10, Rui Costa? Nem por sombras. É Nélson, o lateral-direito.
Boa tarde, Nélson.
Boa tarde, tudo bem?
Sim, obrigado. E o Nélson? [poderíamos estar aqui num pingue-pongue infinito]
Diga lá.
Hoje é o dia do título de campeão mundial sub-20 e reparámos que o número 10 é o defesa Nélson. Como é isso possível?
[risos] Foi sorteio. E fui eu o primeiro a tirar o papel do saco. Saiu o número 10.
E ninguém o olhou de lado?
Que eu me tenha apercebido, não. [risos, parte 2]
Então foi por isso que a numeração ficou toda desregulada?
Pois, Gil a 2, Figo a 3, Rui Costa a 5 [vá lá, aqui não se ri].
E como foi esse Mundial?
Uma experiência inesquecível, daquelas que todos querem viver. Eu tive a sorte de estar lá.
E também o azar. Afinal lesionou-se aos 10 minutos na final, com o Brasil.
É verdade. Foi uma entrada do Roberto Carlos.
O Roberto Carlos?
Esse mesmo. Ele entrou descontroladamente e acertou-me em cheio no tornozelo. Fiquei estendido no relvado e soube logo que ia sair.
Viu o resto do jogo no banco de suplentes?
Não, fui fazer gelo lá para baixo, no balneário.
O quê, então não viu nada?
[Já cá faltava: risos] Nada.
Nem os penáltis?
Nem os penáltis.
Estavam 127 mil pessoas na Luz. O barulho não era suficientemente intenso para se ouvir no balneário?
Nãããã. Quem conhece bem o antigo Estádio da Luz, sabe que não era assim. Nem com aquela enchente.
E quem o informou do resultado?
Ou o Gonçalves [massagista] ou o Carlos Godinho [dirigente da Federação Portuguesa de Futebol]. Não me lembro agora.
Não havia televisão no balneário?
Não, não havia.
E participou nos festejos?
Há de reparar que estou sempre ao pé coxinho.
Como foi viver aquele Mundial do início ao fim?
Um mês e meio de concentração, no Hotel Penta, aquele que agora é o Marriott, ao lado da Católica. Foi divertido, mas ao mesmo tempo saturante. Sabe o que é viver um mês e meio no mesmo quarto que o Paulo Torres? [Risos, parte… já perdemos a conta.]
E aqueles 18 eleitos de Carlos Queiroz, como se governavam?
Bem, não havia internet nem telemóveis. Só televisão e cartas. E o Paulo Torres [já sabe o que o Nélson fez, não sabe?].
Só isso?
Havia mais. Foi uma experiência maravilhosa, e se fosse agora era ainda mais valorizada. Está a ver uma selecção nacional ser campeã mundial em 2011? Como seria o impacto nos jogadores? Muito mais forte que em 1991. Veja lá o exemplo do Rui Costa: qualificou-nos para a final e marcou o penálti decisivo na final. Qual foi o caminho dele? Voltou para o Benfica, após empréstimo ao Fafe.
Qual foi o impacto na vida do Nélson?
Saí do Salgueiros para o Sporting. Cumpri um sonho de criança, porque sou sportinguista.
E havia diferenças entre os jogadores?
Havia o grupo dos cobras e o dos minhocas.
Como?
É isso. Os cobras eram os mais conhecidos, como Jorge Costa, Figo, Rui Costa, João Pinto [Vieira], o outro João Pinto [Oliveira].
E os minhocas?
Eu, Tó Ferreira, Toni, Gil.
Retiro-me então a passe de caracol. Obrigado pelo seu tempo.
Disponha sempre.