Great Scott #163: Qual é a primeira dupla portuguesa numa equipa internacional?
Quinito e Damas, Racing
Quinito é uma figura. Como treinador do Braga, veste-se de gala (fraque) para a final da Taça de Portugal 1982 vs Sporting. E como jogador? Mais que uma figura, é um aventureiro. Começa na Académica, passa para o Belenenses e depois descobre o estrangeiro, em Santander, com o Racing, em 1975. No ano seguinte, recebe a visita do guarda-redes Damas. Pronto, aí está a primeira dupla de portugueses no estrangeiro.
(sim, es verdad, Bastos e Jordão também jogam juntos no Saragoça em 1976-77, só que Quinito e Damas exibem dotes extraordinários fora dos relvados, como entrevistados de luxo)
Começa Quinito.
Como define a sua passagem pelo futebol espanhol?
Positiva.
A adaptação foi fácil?
Muito difícil. Quando cheguei a Santander, era o único que fumava e bebia. Reconheço que foram os empregados dos bares aqueles que mais se esforçaram por integrar-me na sociedade espanhola. No final da aventura, já era um espanhol mais.
Quando voltou a Portugal, era um milionário?
Ganhei muito dinheiro mas também gastei muito. Gosto de viver o presente e não pensar no futuro.
Falemos do futebolista espanhol…
Em Espanha, o jogador de futebol ainda é mal visto na sociedade espanhola porque é desvalorizado e tido sem cultura. Por isso, acho muito bem o movimento de futebolistas de se juntarem para formar uma associação. Nessas reuniões, juntam-se grandes fenómenos, como Cruijff e Pirri, com ‘hombres’ da 3ª divisão.
Fala-se muito das irregularidades no futebol espanhol. Alguma vez jogou drogado?
Não posso assegurar. Não sei se o cognac que tomávamos por intermediários era realmente cognac ou havia extras.
Tomavam cognac?
Sim. Em Santander, havia muito frio e era normal beber brandy ou café. O que não posso assegurar é se essas bebidas estavam adulteradas ou não.
Que papel tem o dinheiro na organização do futebol espanhol?
É o mais importante. O dinheiro compra tudo: jogadores, árbitros, jogos, etc…
Alguma experiência pessoal?
Uma, e quero esclarecer que estava envolvido nela com um companheiro português. Há dois anos, no último jogo da liga, o Santander estava obrigado a ganhar ao Salamanca para salvar-se. Eu e o Damas falámos com o João Alves para ver o que se podia arranjar. Alves disse-nos que a sua equipa nunca iria baixar a guarda e que entrariam em campo para ganhar. Isto demonstra, sem dúvida, a honestidade de Alves e dos seus companheiros.
E como terminou o jogo?
Ganhámos nós, e curiosamente com um golo de Rezza, na própria baliza. Imagine a confusão que se montou. O que está claro é que existe em Espanha uma enorme organização à margem dos jogadores. Os directores compram e vendem jogadores. Tudo se adquire com dinheiro. Em mais de uma ocasião, sabia-se que o árbitro estava comprado mas faltavam sempre provas para denunciá-lo.
E agora é Damas a falar.
Está confiante no sucesso apesar de ter algumas dores no cotovelo esquerdo?
Sim. No Sporting já tive a oportunidade de jogar algumas vezes lesionado, porque o clube não tinha um suplente que desse garantias. Isso, para mim, provocava uma certa tensão.
Parece que assinou pelo FC Porto antes de chegar a Santander. Como foi isso?
De facto, assinei um contrato com o FC Porto mas sem validade federativa. O Racing foi o primeiro clube que se apresentou na federação com a autorização do Sporting. Dizem-me que o FC Porto quer apresentar queixa judicial mas isso não me preocupa minimamente porque sou jogador do Racing.
A presença de Quinito favorece-o ou…?
Favorece-me, claro. É sempre agradável jogar no estrangeiro com um compatriota na mesma equipa. Quinito já me ajudou em muito.
Qual é a diferença entre o futebol português e espanhol?
Fisicamente, vocês [espanhóis] levam vantagem mas no aspecto técnico somos melhores, embora mais lentos que aqui. Pela quantidade de jogadores brasileiros em Portugal, o nosso futebol tende a ser mais artístico.