Pesos, conta e medida

Mais Stop The Press 12/21/2020
Tovar FC

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Pesos, conta e medida

Em 1976, um golpe de Estado leva o sinistro general Videla ao poder. Algumas
interrogações levantam-se quanto à disponibilidade da Argentina realizar o Mundial-78, a Junta Militar assegura o sucesso da prova, com o suspeito
apoio do brasileiro João Havelange, presidente da FIFA, que dá preferência à
candidatura argentina relativamente à do seu país.

Muitos jogadores, como o francês Michel Platini, o holandês Johan Cruijff e até o argentino Carrascosa, tentam convencer a FIFA a trocar de organizador, devido ao regime totalitário de Videla e constantes violações dos direitos humanos. Apesar da polémica e das duas desistências (Cruijff, por estar longe da família, e Carrascosa, por motivos ideológicos), a competição decorre normalmente. Pelo menos, fora de campo.

Dentro, há duas selecções a apresentar a candidatura ao título. A Itália vence a Argentina e empurra-a para Rosário em vez de continuar em Buenos Aires, a Holanda perde com a Escócia e possibilita ao Peru do ex-portista Cubillas a qualificação para a segunda fase em primeiro lugar do grupo.

Concentremo-nos pois no Peru, no grupo de Argentina, Brasil e Polónia. Só o primeiro chega à final. Contra o que é da mais elementar regra, os jogos da
última jornada não são à mesma hora. Assim, quando a Argentina entra em
campo para jogar com o Peru, já sabe o resultado do Brasil (3:1 à Polónia) e o
que fazer para ir à final: “basta” ganhar por quatro golos de diferença.

Acaba 6:0, com o guarda-redes peruano Quiroga (nascido na Argentina, mais precisamente em Rosário, onde decorre o jogo) pouco convincente. Pormenor técnico, a ligação Argentina-Peru começa muito antes desse jogo. Na última jornada de qualificação para o Mundial, em Março 1977, Peru e Chile decidem a última vaga.

A Videla, chefe argentino da Junta Militar, não lhe cai bem o ditador chileno Augusto Pinochet. Politicamente, queremos dizer. No campo desportivo, o Peru
ganha 2:0 em Lima e alivia os problemas da Argentina. Por ora. Um ano e meio depois, o Peru está prestes a entrar em campo para jogar com a Argentina. Em causa está um lugar na final entre Argentina e Brasil, que vê o jogo pela televisão no seu hotel. Antes de subirem ao relvado, os jogadores peruanos recebem a invulgar visita do general mão de ferro Videla, acompanhado de Henry Kissinger,
ex-secretário de Estado dos EUA, e fala-se de um crédito não reembolsável de
quatro mil toneladas de trigo para o Peru.

Essa oferenda, a juntar ao estranho pedido do seleccionador peruano Marcos Calderón de jogar nessa noite com o equipamento alternativo, alimentam a polémica. No relvado, Quiroga, Chumpítaz, Rojas, Manzo e Gorriti explicam como se fabrica um finalista mundial. Ao 6:0 vs Peru segue-se o 3-1 vs Holanda, na noite da consagração. Festa rija na Argentina. É o prémio para um povo oprimido e descontente. O grande prémio, esse, só surgiria alguns anos mais tarde.

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