Great Scott #188: Único árbitro português a esticar o jogo para lá do tempo na UEFA?
Eduardo Gouveia
O Real Madrid é tetracampeão europeu e espreita o penta, em 1960. Nos quartos-de-final, o sorteio reserva-lhe como adversário o Nice, campeão de França. Para a 2.ª mão, no dia 2 Março 1960, a UEFA designa um trio de árbitros portugueses: Eduardo Gouveia no apito, Joaquim Campos e Hermínio Soares como fiscais-de-linha.
Na véspera do jogo no Santiago Bernabéu, o trio de arbitragem português recebe uma visita no hotel em Madrid de um amigo espanhol, também ele árbitro, de seu nome Vicente José Caballero Camacho. Para Joaquim Campos, ‘Caballero fazia jus ao nome e era um homem fantástico, que se dava ‘muy bien’ com os portugueses, razão pela qual nos visitava sempre. E nós retribuíamos essa amabilidade e amizade. Aliás, eu, o Eduardo e o Hermínio fomos em romaria até Madrid para entregar uma placa comemorativa à mulher dele, no funeral dele.”
Na tal visita ao hotel da capital espanhola, Caballero oferece um relógio a Eduardo Gouveia e diz-lhe para usar no dia seguinte. O que se segue é quase quase quase um sketch dos Monty Python. Por algum motivo, a primeira parte é esticada até aos 53 minutos e 53 segundos. ‘O Eduardo Gouveia teve um azar tremendo porque naquele período a bola nunca saiu de campo, pelo que nem eu nem o Hermínio pudemos ir ao seu encontro e dizer-lhe que já passava da hora. Nós bem que gritávamos, em vão.’
Ainda por cima, nesse período de compensações descontroladas, o Real Madrid marca um golo, obra de Di Stéfano, aos 50 minutos. E nem assim Gouveia é avisado. “O público gritava reloj, reloj, reloj e ele nada. Se calhar, nem sabia castelhano. No balneário, quando eu e o Hermínio dissemos ao Eduardo, coitado do homem. Pôs-se a chorar ali à nossa frente. Ninguém gosta de fazer um mau trabalho e a verdade é que o assunto rapidamente se espalhou pela Europa fora, embora a UEFA não lhe tenha feito nada, como suspendê-lo ou repreendê-lo. O problema é o monte de bocas que ele teve de ouvir até ao final da carreira [em 1964], cá em Portugal. Bastava começar o jogo para os adeptos dizerem-lhe ‘olha o relógio’”.
O Real ganha 4:0 ao Nice, com três golos na primeira parte (mais um penálti falhado por Puskas) e um na segunda. Qualifica-se para a ½ final da Taça dos Campeões, que haveria de conquistar numa brilhante final vs Eintracht Frankfurt, em Glasgow (7:3). Isso é outra história. Que prometemos contar a tempo e horas.