#9 Sporting 1973-74
A glória volta a Alvalade. João Rocha é eleito presidente do clube a 7 Setembro 1973 e promete títulos. O resultado inicial é desanimador, com uma derrota em Setúbal (1:0). Aliás, essa primeira jornada da 1.ª divisão 1973-74 é ainda hoje o único dia em que os três grandes perdem, e sem marcar qualquer golo – Benfica cai no Bessa (2:0) e Porto no Restelo (1:0).
O Sporting nem acusa o golpe por aí além e acumula sete vitórias seguidas até ao empate nas Antas (1:1). Pelo meio, duas goleadas monstras vs Oriental (7:0) e Montijo (8:0), com Yazalde a chegar aos 19 golos à 9.ª jornada. O céu é o limite. Seja aqui em Portugal ou lá fora na UEFA. Como vencedor da Taça de Portugal (3-2 ao Vitória FC), o Sporting apresenta-se na Taça das Taças e o sorteio é generoso nas duas primeiras rondas. Tanto o representante galês Cardiff como o representante inglês Sunderland jogam na 2.ª divisão inglesa. Ambas as eliminatórias resolvem-se em Alvalade com golos de Yazalde e Fraguito.
Quando a primeira volta acaba (6:1 vs Barreirense com hat-trick de Yazalde), o Sporting é líder isolado. Atrás, o surpreendente Vitória FC de Pedroto, que ganhara nessa tarde 3:2 na Luz e colocara um ponto final de invencibilidade do Benfica em casa de 109 jogos, desde Novembro 1965. Na jornada seguinte, 2:1 ao Vitória FC com Yazalde a fixar o resultado. A tranquilidade é efémera e as visitas ao Bessa (1:1) mais Restelo (1:0) provocam dupla desilusão.
Nada como uma goleada para sossegar o espírito e Yazalde faz mais seis no 8:0 ao Oriental. Como a equipa é um todo, um bis de Dinis desfaz o nulo vs FC Porto (2:0) e um golo solitário de Nélson em Guimarães traduzem uma supremacia inaudita, com quatro pontos à maior do Benfica. Na Taça das Taças, o Zurique é despachado em três tempos: Nélson, Marinho e Yazalde. A segunda mão é um mero pró-forma.
Na ressaca do apuramento para a meia-final europeia, o Sporting é atropelado pelo Benfica. Se bem que Yazalde abre o marcador com um salto de peixe (sua imagem de marca registada) e ainda engana José Henrique de penálti, a verdade é que o Benfica dá um golpe de autoridade por excelência. Entre os dois golos do argentino, Humberto, Nené e Nené aquecem o dérbi. Na segunda parte, Jordão e Vítor Martins aumentam para 2:5. No último suspiro, e já sem Yazalde em campo, Dé conclui um inesperado 3:5. Para a história, o último dérbi do Estado Novo.
Pois é, a revolução anda aí. Cravos e tal. Por essa altura, o Sporting esgrime argumentos com o Magdeburgo. Em Alvalade (1:1), uma avalanche de futebol ofensivo choca com uma bola no poste e um penálti falhado por Dinis ainda com 0:0. O golo de cabeça de Manaca em resposta ao de Sparwasser alimenta o sonho. No dia 24 Abril, e sem Yazalde, lesionado, o Sporting perde 2:1 na RDA e diz adeus à final de Roterdão, vs Milan – o suplente Tomé falha o empate e a qualificação por golos fora aos 87 minutos.
Começa então a viagem mais longa do Sporting. De Magdeburgo para Berlim, onde João Rocha dá conta à restante comitiva de um golpe em Portugal. Poucos acreditam, pela escassez de informação e falta de contacto com as famílias. Na chegada a Frankfurt, aí sim, o caso muda de figura. A BBC noticia largamente a queda da mais velha ditadura europeia. As canções ‘E Depois do Adeus’ de Paulo Carvalho às 2255 e ‘Grândola Vila Morena’ de Zeca Afonso às 0020 lançam as sementes de uma operação militar sem precedentes.
Derrubada a ditadura, só falta o Sporting entrar em Portugal. O presidente João Rocha (sempre ele) consegue arranjar lugar para todos num voo para Madrid à última hora. Depois, uma viagem de autocarro até Badajoz. Na fronteira, stop. Só João Rocha em conversações com o General Spínola consegue desbloquear a situação e o Sporting chega a Lisboa no dia 27, véspera do jogo de Taça de Portugal vs Belenenses. O brasileiro não está nem aí para a revolução e abre caminho com um bis (2:1).
O regresso de Yazalde ao onze é a boa notícia da antepenúltima jornada em Coimbra e o argentino confirma o estado de graça com o primeiro golo. Acaba 3:0. Só faltam duas vitórias para o título de campeão. Em casa, 5:0 vs Olhanense. No Barreiro, 3:0 ao Barreirense. Quem fecha a torneira do golo é Yazalde, autor de 46 golos, uma espantosa média de 1,586 golos por jogo – dois recordes ainda em vigor na 1.ª divisão. De uma assentada, Bola de Prata (melhor marcador nacional) e Bota de Ouro (melhor marcador da Europa).
Só falta mesmo a Taça de Portugal. No Jamor, há dérbi. Durante a época, o balanço é francamente favorável ao Benfica, duas vitórias e 7:3 em golos. Para cúmulo, o Sporting emite um comunicado a demitir unilateralmente o treinador Mário Lino. É o adjunto Osvaldo Silva quem lidera as tropas, por assim dizer. Ou não. Mário Lino é o homem do leme e o Sporting ganha 2:1, após prolongamento. Bem vistas as coisas, é mesmo a última final ganha vs Benfica, perdidas as de 1987, 1996 e 2009 (Taça da Liga).
No dia 9 Junho 1974, já sem Yazalde, em estágio com a Argentina, de olho no Mundial da RFA, todos os golos acontecem na baliza norte. O primeiro é de Nené, isolado por Jordão. O empate chega no último suspiro, por Chico, de cabeça. E o decisivo 2:1 é de Marinho, servido por Chico (uma autêntica pilha Duracell). A baliza sul convive com a solidão do golo, muito embora o árbitro César Correia tivesse apitado penálti de Alhinho sobre Jordão antes de voltar atrás na decisão, quiçá amedrontado com a vasta multidão estacionada nas quatro linhas, como se o Jamor não tivesse espaço mais que suficiente.
Seja como for, o Sporting de Lino é um justo vencedor pelo espírito de combatividade sempre presente e conquista a dobradinha num dia histórico pelo reatamento de relações entre os dois clubes, com Spínola a abraçar a causa no aperto de mão entre os presidentes João Rocha e Borges Coutinho.
A época de sonho ainda tem mais um capítulo, o de Yazalde pela Argentina. Com dois golos ao Haiti, o Chirola estabelece a marca de 52 golos na época desportiva e é o primeiro estrangeiro a representar uma equipa portuguesa a marcar num Mundial.
(a negrito, os jogos fora) (a itálico, os jogos da Taça de Portugal)
- Vitória FC 0:1
- Boavista 3:1 (Yazalde-2 Fraguito)
- Cardiff 0:0
- Leixões 3:0 (Yazalde-2 Dinis)
- Belenenses 4:1 (Nélson Dinis Fraguito Yazalde)
- Cardiff 2:1 (Yazalde Fraguito)
- Oriental 7:0 (Yazalde-4 Alhinho Nando Chico)
- Farense 3:0 (Yazalde-2 Fraguito)
- Sunderland 1:2 (Yazalde)
- CUF 3:0 (Yazalde-2 Tomé)
- Montijo 8:0 (Yazalde-6 Chico Fraguito)
- Sunderland 2:0 (Yazalde Fraguito)
- FC Porto 1:1 (Chico)
- Vitória SC 3:0 (Nélson-3)
- Benfica 0:2
- Beira-Mar 5:2 (Marinho-3 Dinis Yazalde)
- Académica 3:0 (Yazalde-2 Marinho)
- Olhanense 3:1 (Yazalde-2 Nélson)
- Barreirense 6:1 (Yazalde-3 Nélson-2 Marinho)
- Vitória FC 2:1 (Marinho Yazalde)
- Boavista 1:1 (Vagner)
- Leixões 3:0 (Chico-2 Yazalde)
- Belenenses 0:1
- Oriental 8:0 (Yazalde-5 Baltasar-2 Nélson)
- Farense 2:0 (Yazalde Manaca)
- CUF 6:0 (Yazalde-3 Dinis-2 Vagner)
- Zurique 3:0 (Nélson Marinho Yazalde)
- Montijo 4:1 (Marinho-2 Yazalde Alhinho)
- FC Porto 2:0 (Dinis-2)
- Zurique 1:1 (Baltasar)
- Vitória SC 1:0 (Nélson)
- Benfica 3:5 (Yazalde-2 Dé)
- Vitória FC 4:2 (Manaca Dé Chico Marinho)
- Magdeburgo 1:1 (Manaca)
- Beira-Mar 1:1 (Yazalde)
- Magdeburgo 1:2 (Marinho)
- Belenenses 2:1 (Dé-2)
- Académica 3:1 (Yazalde Nélson Baltasar)
- Olhanense 5:0 (Yazalde-2 Marinho Dé Manaca)
- Barreirense 3:0 (Baltasar Nélson Yazalde)
- Boavista 2:0 (Mário João pb Nélson)
- Olhanense 2:1 (Dinis Marinho)
- Benfica 2:1 (Chico Marinho)