Great Scott #395: Quem é o primeiro árbitro português a denunciar uma tentativa de aliciamento em jogos da UEFA?
Francisco Lobo
Árbitro da 1.ª divisão desde Setembro 1968 (U. Tomar 1:1 Atlético), o setubalense Francisco Lobo chega a internacional pela UEFA em Setembro 1971 (Komló 2:7 Estrela Vermelha). As suas exibições pautam-se pela sobriedade e excelência, é homem de impor o respeito com naturalidade sem alaridos.
Em 1972-73, o sensacional Derby County de Brian Clough elimina o Benfica de Jimmy Hagan nos quartos da Taça dos Campeões com 3:0 no Baseball Ground e 0:0 na Luz. Nas meias-finais, o Derby encontra a Juventus e perde 3:1 em Turim. Para a segunda mão, a UEFA nomeia o árbitro português Francisco Lobo.
Na semana anterior ao jogo, Lobo recebe um telefonema em sua casa de um tal Deszo Solti, ‘empresário’ húngaro a mando da Juventus. A conversa é desconcertante pelo descaramento da oferta: férias para a família toda em local paradisíaco. Lobo vai pensar, Solti agenda um segundo telefonema. Nesse entretanto, Francisco liga ao presidente dos árbitros portugueses, um tal Rafael Rodrigues.
No momento da segunda chamada telefónica, a conversa já é gravada para escutar a oferta e enviar o material para quem de direito — a UEFA, claro. À época, o presidente da UEFA é o italiano Artemio Franchi, nome do estádio da Fiorentina. O dirigente ouve tudo e decide manter Francisco Lobo com árbitro do Derby vs Juventus, auxiliado pelos compatriotas César Correia e Fernando Leite. Acaba 0:0, no dia 25 Abril 1973. Lobo acumula outra arbitragem de alto nível e a Juventus, sem ajudas, segue em frente. Na final, o Ajax de Cruijff é tricampeão europeu.
Nesse Verão 1973, Lobo é finalmente ouvido pela UEFA, através do Comité de Disciplina, em Zurique. Na ausência de Franchi, é um checoslovaco quem preside à reunião com a ajuda de uma tradutora contratada pela embaixada portuguesa naquela cidade suíça. Uma semana depois, a 29 Junho, já em Glasgow, por ocasião de uma reunião de emergência da UEFA, sai uma nota oficial a dar conta da decisão uefeira de punir severamente no caso de se apurar uma verdade incontroversa.
É a lenga-lenda do costume, mão de ferro em tecido de veludo. O caso arrasta-se sem aparato noticioso. Em Novembro 1973, a UEFA dá um bombom a Lobo e nomeia-o para o Inglaterra vs Itália em Wembley. Decide um golo de Capello, 0:1. ‘É o momento mais grandioso da minha carreira como jogador.’ E também o é para Lobo na carreira de árbitro.
Só em Abril 1974, na véspera do 25 Abril, a UEFA emite outro comunicado a dar conta do arquivamento do processo por falta de provas. O telefonema em si não é elucidativo, garante a entidade. Lobo, esse, continua a apitar e abandona a arbitragem em Junho 1978 (Portimonense 2:1 Riopele) com um feito único, o do primeiro português a dar conta à UEFA de uma tentativa de aliciamento.