Great Scott #670: Quem comete a falta mais madrugadora de sempre em finais europeias, aos 21 segundos?
Couto
Memorável, para todo o sempre. A final da Taça UEFA 1995-96 entre Juventus e Parma é a primeira com um português de cada lado: Couto vs. Paulo Sousa.
Equipas da moda em Itália, a Juventus sagrar-se-ia campeã italiana e ainda festejaria a dobradinha, precisamente vs. Parma (3:0 no conjunto das duas mãos). Pelo meio, o Parma rouba-lhe o triplete. Um golo de Dino Baggio em Parma (1:0) e outro em Milão (1:1) garantem o segundo sucesso internacional do Parma, o primeiro de Couto.
A Juventus é aquilo que a gente sabe, uma máquina trituradora de títulos. Campeã da Taça UEFA 1993, com Giovanni Trapattoni, volta à final dessa competição em 1995, agora com Marcello Lippi. Pela frente, um Parma estratosférico de Nevio Scala. Na caminhada para a final, a Juventus elimina o Marítimo (1:0 nos Barreiros, 2:1 em Turim) e chega invicta. Já o Parma perde dois jogos em 10 (vs. Vitesse e Athletic). Pormenor delicioso: é a terceira final europeia seguida do Parma, após a conquista da Taça das Taças 1993 (Antuérpia 3:1) e a perda da Taça das Taças 1994 (Arsenal 1:0).
A primeira mão é no Ennio Tardini, com Couto e Paulo Sousa a vestirem o mesmo número seis. O Parma marca cedo, aos cinco minutos. Zola domina, controla e abre a defesa ao meio com um passe aéreo. A bola cai no limite da área e Dino Baggio atira à saída do desemparado Rampulla, titular na ausência de Peruzzi, lesionado. Daí para a frente, só dá Juventus. É um chorrilho de oportunidades perdidas. Ou melhor, de defesas do arco da velha por parte de Bucci.
O homem defende uma bola de Ravanelli, outra de Marocchi e mais uma de Vialli – esta, com a ponta dos dedos e a um remate à queima-roupa na pequena área, é um monumento, entusiasticamente aplaudida atrás da baliza por um adepto disfaraçado de jornalista (ou vice-versa), com Vialli a cumprimentá-lo com fair-play.
A segunda mão é em Milão, no Giuseppe Meazza, porque a Juventus reúne mais adeptos fora de Turim do que propriamente na sua cidade e o Delle Alpi está invariavelmente às moscas. Paulo Sousa é o 6, Couto idem idem. Moeda ao ar e sai o Parma. No meio-campo, Asprilla e Zola preparam o pontapé de saída. Quando o belga Van den Wijngaert vai apitar, Asprilla protesta pela proximidade de Roberto Baggio. O árbitro manda recuar e o capitão afasta-se para lá do círculo central. Só depois é que se dá o início do prélio.
Zola para Asprilla, depois para Couto, primeiro toque para Susic e, perante a ameaça do irrequieto Baggio, um pontapé lá para a frente. A bola voa quase de uma área para a outra. Peruzzi recolhe no limite da área e cede para Jarni. O lateral croata sobe até ao meio-campo e encaminha a bola para a esquerda, onde está Ravanelli. O número 11 é varrido por Couto. É a primeira falta do jogo, aos 21 segundos. Recorde absoluto, nunca visto e jamais repetido.
Ravanelli continua no chão, a queixar-se, e o árbitro chama Couto. No quadradinho seguinte, Couto já está a caminho da sua área e a informação do cartão amarelo é anunciada em rodapé. É só rir. É também de Couto o primeiro remate (espécie de) à baliza da Juventus. É um cabeceamento no coração da área, muito por cima. Na altura, já há 1:0. Por sinal, um golo esplêndido. Tanto o passe longo de Torricelli como a conclusão de Vialli. Pim pam pum, Bucci nem se mexe. O remate cruzado e de primeiro é indefensável e a bola entra no ângulo superior.
Chega o intervalo e suspense com 1:1 na eliminatória. No reinício, o Parma marca aos 53’ numa jogada de equipa com o envolvimento de sete jogadores até ao cruzamento do suplente Mussi pela direita e o cabeceamento de Dino Baggio à boca da baliza, já com Peruzzi batido pelo ressalto no corpo de Porrini aquando do centro. Agora é preciso a Juventus marcar mais duas vezes para acariciar o troféu. Nada feito, o Parma fecha-se bem e conserva o 1:1.
Nos festejos, a equipa da Juventus senta-se no banco de suplentes enquanto assiste à festa do Parma. Atrás da baliza dos dois golos da noite, os adeptos parmesãos exageram e lesionam Asprilla na testa. Sem se aperceber desse detalhe, Couto mete-se às cavalitas de Crippa e bate palmas. Depois, toma conta da ocorrência e dá um estalo a Asprilla, estilo ‘wake up call’. O colombiano nem ai nem ui. A entrega do troféu é ruidosa, a curva do Parma grita a plenos pulmões, Couto também. É dele a taça, e o recorde da falta mais madrugadora de sempre em finais europeias e do respectivo amarelo. Que figura.