#24 Hansa Rostock 1990-91
O hino, acima de tudo. É lindíssimo. Depois as letras DDR bordadas na camisola. A RDA é todo um mundo sensorial. No chuto, há de tudo. Europeus, zero. Nem um para amostra. Aliás, o primeiro jogo de sempre em eliminatórias até é vs Portugal, derrota em Berlim com golos de Matateu e Coluna. Mundiais, só um – o tal na RFA em 1974. Nos Jogos Olímpicos, uma medalha de ouro em 1976 (vs Polónia 3:1), outra de prata e duas de bronze. Nas competições por clubes, o Magdeburgo é o único a levantar um título europeu, a Taça das Taças 1974, vs Milan. Uns anos antes, a 4 Novembro 1970, um acontecimento sui generis: Carl Zeiss e Vorwäerts eliminam Sporting e Benfica, no José Alvalade e em Frankfurt, respectivamente.
E a nível interno, o campeonato da RDA? O maior da aldeia é o Dínamo Berlim, com 10 títulos, seguido de perto por outro Dínamo, o de Dresden (8). A fechar o pódio, o Vorwärts Frankfurt (6). Então e o Carl Zeiss Jena? Só três – e nove vezes em segundo. E o Magdeburgo? Também só três. Acredite, nenhum destes cinco é o último campeão nacional da RDA. Essa honra cabe ao Hansa Rostock, que, pasme-se, nunca acabara em primeiro. O melhor de sempre é um segundo lugar, em 1968. Pois bem, 22 anos depois, eis o Hansa à frente da malta toda, três pontos à maior do Dínamo Dresden. Os dois sobem à 1.ª divisão da Alemanha reunificada, edição 1991-92.
O contexto é mais político que desportivo, lógico. A cena do muro está para acabar, aquilo não tem pés nem cabeça. As quatro potências (EUA, URSS, França e Inglaterra) lá convencem as duas Alemanhas e aqueles 66,5 km de gradeamento metálico caem, juntamente com as 302 torres de observação, as 127 redes electrificadas com alarme e as 255 pistas de corrida para os cães de guarda. Acaba-se a RFA, acaba-se a RDA. Curiosamente, as duas saem sorteadas no mesmo grupo de apuramento para o Euro-92. Vai a Alemanha, finalista vencida com três democráticos no plantel (Matthias Sammer, Andreas Thom e Thomas Doll).
O último ano futebolístico da RDA é de sonho. Para o Hansa, claro. À conquista do inédito título de campeão, a primeira Taça. Em duas semanas, a cidade transforma-se na capital do futebol alemão. E a alegria manter-se-á ainda por alguns meses, com um início de época como poucos, a bater o pé a alguns históricos da RFA (Nuremberga 4:0, Bayern 2:1 em Munique, Dortmund 5:1) e até da Europa (Barça 1:0). Para chegar a esse ponto, o Hansa reúne uma série de actores secundários, pouco ou nada conhecidos do grande público.
O treinador idem idem. É ele, Uwe Reinders. Como jogador, é fera. De selecção e tudo. E acumula um golo no Mundial-82, vs Chile. O feito vale-lhe a transferência para o Bordéus, onde apanha Chalana e ganha uma Taça de França, numa final vs PSG em que falha um penálti ainda com 0:0. No regresso à RFA, inscreve-se no Eintracht Braunschweig. Primeiro como jogador, depois como treinador. Em três épocas (1987-90), nada de especial. Assina pelo Handa e aí, senhoras e senhores, espectáculo assegurado.
O plantel junta uma série de cromos, alguns deles naturais de Rostock, como o guarda-redes Hoffmann, o central Alms e o médio Dowe. A espinha dorsal completa-se com Fuchs, melhor marcador da equipa com 12 golos. Pelo meio, há Schlünz e Weilandt. Um é especialista em livres directos, o outro é o carregador de piano. Juntos, 811 jogos pelo Hansa – Schlünz ainda hoje é o recordista do Hansa, com 406. O reforço é Caligiuri, contratado por 50 mil marcos ao Meppen. Ya, esse mesmo, o Caligiuri da selecção dos EUA, presente em todos os jogos do Mundial-90 e 94. É a grande figura.
Isso é que era doce, no way. A grande referência do clube é Mike Werner. É tão bom tão bom tão bom que nem tem página de inglês no wikipedia. A sua melena é qualquer coisa de divinal. Parece saído do ‘Final Countdown’ dos Europe. E o futebol? Uh la la, c’est magnifique. Joga em todo o lado, corre o tempo todo. A sua história é do além: no primeiro dia de treinos, chaga atrasado. E porquê? A sua moto tem um problema mecânico e apanha o comboio de Cottbus para Rostock. A reprimenda de Reinders é épica. O miúdo de 21 anos recompõe-se em dois tempos. No dia seguinte, aparece a horas. Sentado numa Harley Davidson. Que classe.
A epopeia do título é como quase todas, com altos (muitos) e baixos (alguns). O pico é atingido a três jornadas do fim, a 4 Maio 1991, com 3:1 ao Dínamo Dresden, segundo classificado. Com sete pontos de avanço e só seis por disputar, o Hansa dá largas à sua alegria e mete férias até à final da Taça, arrebatada já em Junho, dia 2, vs Stahl Eisenhüttenstadt, com golo solitário de Wahl, natural de Rostock e formado no Hansa. Perfeito, o final ideal. Auf Wiedersehen.
(a negrito, os jogos fora)
Stahl Eisenhüttenstadt | 1:1 | Weichert |
Carl-Zeiss Jena | 3:0 | Weichert / Röhrich / Fuchs |
Stahl Brandenburgo | 2:0 | Dowe / Röhrich |
FC Berlim | 3:0 | Fuchs-2 / Röhrich |
Chemie Halle | 1:1 | Dowe |
Chemnitzer | 2:0 | Weilandt / Babendererde |
Vorwärts Frankfurt | 2:0 | Weilandt / Fuchs |
Rot-Weiss Erfurt | 1:1 | Alms |
Energie Cottbus | 2:0 | Fuchs / Weichert |
Dínamo Dresden | 0:0 | |
Sachsen Leipzig | 2:1 | Fuchs / Babendererde |
Magdeburgo | 2:0 | Babendererde / Fuchs |
Lokomotiv Leipzig | 2:3 | Weilandt / Weichert |
Carl-Zeiss Jena | 3:1 | Dowe-2 / Schlünz |
Stahl Eisenhüttenstadt | 3:2 | Babendererde / Röhrich / Schlünz |
FC Berlim | 3:2 | Fuchs-2 / Alms |
Chemie Halle | 1:1 | Fuchs |
Stahl Brandenburgo | 0:0 | |
Chemnitzer | 1:1 | Alms |
Vorwärts Frankfurt | 3:1 | Weichert / Fuchs / Schlünz |
Rot-Weiss Erfurt | 0:1 | |
Energie Cottbus | 1:1 | Weichert |
Dínamo Dresden | 3:1 | Schlünz-2 / Fuchs |
Sachsen Leipzig | 1:1 | Wahl |
Magdeburgo | 1:2 | Schlünz |
Lokomotiv Leipzig | 1:4 | Weichert |