Hóquei. O hat-trick mais glorioso do desporto português
E que tal debitar datas gloriosas do desporto nacional? Olha olha, bem fixe. Há um sem número de efemérides. Sem pestanejar, as três primeiras saem para o papel: 10 Julho 2016 mais 12 Agosto 1984 e 3 Março 1989. Se fosse por figuras, a ordem seria Éder, Carlos Lopes e Carlos Queiroz. Seguem-se outras datas: 15 Maio 1964, 2 Maio 1962, 27 Maio 1987. Morais, Eusébio e Madjer. Há mais, claro. 26 Maio 2004, 31 Maio 1961, 23 Setembro 1988. Mourinho, Águas e Rosa Mota. Engraçado, o jogo. Mais três, vá. 8 Junho 1991, 8 Junho 1991, 8 Junho 1991.
Oito Junho 1991. Que se passa? É tão-só o dia mais preenchido do nosso desporto. Em menos de três horas, o hóquei português conquista todas as três competições europeias. A noite é de festa para Óquei de Barcelos, inédito campeão europeu, Sporting, bicampeão da Taça das Taças, e Benfica, inédito vencedor da Taça CERS. Que espectáculo, que sonho.
Começa-se pelo início, a Taça dos Campeões. Há oito países e nove clubes. Portugal é o repetente. Entra o FC Porto, como campeão europeu em título, e ainda o Óquei, 2.º classificado do campeonato nacional. Segundo?! Então e o primeiro? É o Porto, sempre ele. Por isso mesmo, o Óquei joga uma pré-eliminatória, vs Waslum, campeão da RFA. É trigo limpo, farinha amparo, com 13:2 em Duisburgo e 16:4 em Barcelos. Na ronda seguinte, o duelo fratricida com o Porto. Decidido nos pormenores, como seria de esperar (4:4 no Minho, 5:4 no Porto). O sorteio das meias-finais é um mimo e calha-lhe o campeão francês La Vendéenne. É um fartote de golos, com 22:3 em Barcelos e 22:0 em La Roche-sur-Yon.
A final é com o Roller Monza, bicampeão italiano em título e já vencedor de uma competição internacional, a Taça das Taças em 1989 (vs Porto, 10:9). A primeira mão acaba empatada a três golos. Na segunda, o Óquei sai-se melhor no prolongamento. Antes, os italianos dominam a marcha do marcador. Cinquini 1:0. Domingos Carvalho 1:1 e vamos para intervalo. Na segunda parte, Paez 2:1. O Óquei dá então a volta, por Serginho e Pedro Alves. Grande agitação no pavilhão em Monza, até que Alejandro firma o 3:3.
Vamos para prolongamento. É aí que Pedro Alves, então um jovem de 17 anos, abre o caminho para a histórica vitória. O jovem de 17 anos recupera uma bola perdida no meio-campo, dribla um, dribla dois e atira cruzado, sem qualquer hipótese para o guarda-redes Cupisti. Está feito o 3:4 ao quarto minuto. Agora é aguentar e o Óquei aguenta bem. O treinador Cristiano Pereira nem cabe em si de contente. “Correu tudo como planeado: começámos numa toada prudente, a marcar à zona. Depois soltámo-nos e começámos a fazer jogadas de ataque organizado. Lá atrás, sabíamos que podíamos contar com as defesas do Guilherme. É uma alegria ganhar aqui no meio deste ambiente difícil.”
O cinco do Óquei contempla Guilherme, Domingos Carvalho (1), Paulo Jorge, Serginho (1) e Pedro Alves (2). Jogam ainda Pedro Mendes, Alfredo, Gil, Pires e Vítor Silva.
A Taça das Taças fala português. Nas primeiras 14 edições, quatro equipas ganham oito títulos (Oeiras-3, Sporting-2, Porto-2, Sanjoanense). Em 1990-91, o representante é o Sporting, como vencedor da Taça de Portugal (5:4 ao Óquei de Barcelos, no desempate de grandes penalidades em Cascais). Só há sete equipas e, no papel, só o Novara é igualmente forte. Nos quartos, o Sporting dá conta do Marathon. Em Haia (Holanda), 6:4. Em Lisboa, 7:2. Nas meias, os franceses do Gazinet-Cestas nem tomam conta da ocorrência. Em Lisboa, 6:4. Em Cestas, nos arredores de Bordéus, 6:1.
A final é outro pró-forma para o Sporting. Em Novara, 7:6. Duas semanas depois, a sexta e última vitória da competição, na nave de Alvalade onde não cabe um alfinete. Os italianos entram a defender num quadrado fechado, Fanã arromba o ferrolho com um potente remate do meio da rua. Desbloqueado o nulo aos quatro minutos, o Novara reage com galhardia e empata aos 10’, por Chiarello. O Sporting responde à letra, por Luís Rodrigues, aos 16’. Chiarello volta a empatar, perto do intervalo. Fim da linha. Para o Novara, claro.
O Sporting continua a desbobinar jogo como nunca e mais ainda quando o treinador José Carlos faz entrar o veterano Campelo, expulso com cartão azul na primeira parte, por desentendimentos com Bernardini. No último jogo da carreira, Campelo enche-se de brio e marca os últimos três golos do jogo. Acaba 5:2. Enorme festa para o Sporting e fair-play do português Luís Nunes, jogador do Novara. “Temos uma equipa muito experiente, mas não pudemos fazer frente a um adversário que teve em Chambel meia equipa, tal como o seu público, que conheço bem de outros tempos.”
O cinco inicial do Sporting: Chambel; Campelo (3), Fanã (1), Luís Rodrigues (1) e João Pedro. Suplentes utilizados: Leste e Zorro.
Por fim, a Taça CERS. É a 11.ª edição. O Sesimbra ganha a edição inaugural, em 1981. Na final, despacha o Lichstad, em Eindhoven (Holanda). Três anos depois, é a vez do Sporting levantar o caneco, em Lisboa (11:3 ao Novara). Fim da história. Em 1990-91, há 17 equipas participantes, três das quais portuguesas. A Sanjoanense é afastada nos oitavos pelo Igualada numa eliminatória muito desigual (12:1 no geral) e a Oliveirense nos quartos, pelo Benfica. Há emoção qb, a avaliar pela diferença de um golo (10:2 na Luz, 7:0 em Oliveira de Azeméis).
Nas meias, o Benfica ganha 5:3 em Itália e segura a vantagem na Luz (5:5), vs. Marzotto Valdagno. Eis a final, vs Reus – que dá completamente a volta ao Igualada (de 1:5 fora para 5:0 em casa). Na primeira mão, a superioridade do Reus vale-lhe uma vantagem de dois golos (6:4). Na segunda, em Lisboa, a categoria do Benfica é mais que evidente. Aos seis minutos, 3:0. Ao intervalo, 6:1. É o delírio da massa associativa. A titularidade de António Rocha (ex-Reus) é o clique. Só ele marca mais golos que o próprio Reus (4:3). Quando assina o 7:3 num remate de longe e cruzado, o pavilhão da Luz vai abaixo e solta-se o grito ‘campeão’. Ou então ‘só mais um’. O pedido é satisfeito três vezes, acaba 10:3.
O treinador Carlos Dantas está nas nuvens. “Não havia táctica para este jogo, só pressionar e ganhar a posse de bola. Ganhámos o primeiro título internacional, dias depois da conquista da Taça de Portugal”, numa alusão ao 3:1 vs Turquel, em Carregal do Sal. O cinco inicial do Benfica: Fernando Almeida, Paulo Almeida (1), Luís Ferreira (2), António Rocha (4) e Vítor Fortunato. Suplentes utilizados: Carlos Garção, Jorge Conceição (2) e Rui Lopes (1)