Manolo el del Bombo. ‘Nuno Gomes não está cá, pois não? Então…’
Manolo el del Bombo. “Nuno Gomes não está cá, pois não? Então…”
O talismã da Espanha acumula oito Europeus e tarda em festejar uma vitória sobre Portugal: empate em 1984, derrota em 2004
De barba e óculos, anda com uma camisola vermelha da selecção de Raul Meireles e tem mais tempo de antena que Rui Patrício e Bruno Alves… juntos! Chama-se Fred, é do “fêquêpê” e ai de quem lhe toque nas camisolas azuis e brancas com Alenitchev escrito nas costas. Vai a todas: Alemanha e Dinamarca em Lviv, Holanda em Kharkiv e República Checa em Varsóvia. Aparece na televisão a protestar, a aplaudir e a festejar, com uma fita na cabeça à Rambo. Amanhã, não o procure na bancada porque não vai ter essa sorte. O senhor tem de trabalhar e já está em casa. O talismã de Portugal neste Europeu está fora. E o da Espanha? Manolo el del Bombo está aqui. Na Polónia. Com a camisola número 12 e o bombo, claro.
Desde quando alegra a selecção espanhola?
Desde o Espanha-82. Vivia em Valência, uma das cidades-sede desse Mundial.
1982, 1986, 1990…
Escusas de contar, são oito Mundiais e oito Europeus.
No início, ias e vinhas num instante. Agora é que ficas mais tempo.
É verdade, a minha família estava sempre a gozar comigo e nem me dizia boa viagem. Era até já. Os jogadores eram bons, alguns até mais que bom mas os de agora são extraordinários. Temos uma geração brilhante.
Qual foi a sua maior decepção?
A do Mundial Coreia/Japão-2002. Se passássemos aquele jogo com a Coreia, íamos ser campeões.
E a maior alegria?
Entre a final de Viena [Euro-2008] e a de Joanesburgo [Mundial-2010], escolho a de Viena porque a minha banda esteve o tempo todo a tocar ao lado dos alemães num ambiente descontraído.
O que é feito da tua banda?
Uyyyyy, não deu para trazê-los desta vez. Era uma viagem muito cara e vim só eu.
Sei que passaste mal no Mundial-2010, o que te aconteceu. Horror às vuvuzelas?
[risos] As vuvuzelas tinham um som muito linear, o bombo dava cabo delas [mais risos]. Não, contraí uma gripe muito forte que nunca mais passava. Fui operado seis vezes a uma hérnia e até parecia que o peito ia sair pela boca cada vez que tossia. Preferi então voltar a casa para curar-me e estar a tempo da final.
Na final?
Somos a Espanha. Vamos o mais longe possível. Perdi só um jogo e voltei a tempo de ver [encosta-se a nós e abre os olhos] a final!
Essas viagens, vais por ti ou tens patrocínios?
Muitas por mim, mais recentemente tenho patrocínios. No Euro-2008, a cerveja Cruzcampo ajudou-me. No Mundial-2010, foi a vez do Burger King. Mas não sou nenhum pesetero como às vezes ouço por aí. Se assim fosse, não recusava as ofertas de publicidade no meu bombo. Todos querem ter publicidade gratuita, compreendo, mas aqui no meu bombo só se vai ler ‘desporto sim, violência não’.
Violência, alguma vez conviveste de perto?
O mais perigoso que vivi foi um assalto na auto-estrada. Roubaram-me o bombo e a boina mas tiveram que me deixar objectos parecidos para animar a selecção. No fundo, são situações engraçadas. Nada comparado, por exemplo, com o Arsenal-Valencia.
Quê?
Arsenal-Valencia em 1980, final da Taça das Taças. Ganhámos nos penáltis mas já se sentia o hooliganismo dos ingleses. Além disso, a final foi em Bruxelas no Heysel…
Tem privilégios junto dos jogadores?
Sim, posso entrar no hotel deles e cumprimentá-los mas não o faço. Ou entram todos os adeptos ou não entra nenhum. Não sou mais importante que ninguém. No fim de contas, sou o Manolo el del Bombo.
Por falar no bombo, esse anda contigo desde 1982?
Nem pensar. Já dei sete ou oito a estudantes por esse mundo fora, perdi um na Costa Rica, ofereci outro na Venezuela. Este bombo é apenas o mais recente.
Roubaram-te aquele na autoestrada e nunca mais te assaltaram?
Uma vez, na Bósnia. Estávamos a sair do autocarro para ir ver os sub-21, juntamente com os jornalistas espanhóis, quando ouvimos um ruído estridente. Arrombaram a bagageira e levaram-me o bombo. No instante seguinte, a polícia apanhou-os e final feliz.
Quais são as hipóteses da Espanha neste Euro?
É muito, muito difícil voltar a ganhar. Depende de factores como sorte, talento, árbitros. Está claro que somos a selecção mais talentosa da Europa mas isso não nos garante nada.
E se jogarem com Portugal?
Ganhámos o último jogo [1-0 no Mundial-2010].
Calma lá, estamos num Europeu, certo? Falemos de Europeus.
Bem, aí a minha estatística não é famosa com vocês. No Euro-84, um-um. Vinte anos depois, um-zero por…
Por…
Nuno Gomes, eso es! Mas ele não está cá, pois não?
Não.
Ah, então… [e ri-se como quem diz ‘já foram’, nós portugueses]
in jornal i, Jun 2012