Os 17 mandamentos de Pedroto

Kali Ma Mais 01/08/2022
Tovar FC

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Os 17 mandamentos de Pedroto

José Maria Pedroto é um nome incontornável no futebol português, sobretudo pela exemplar carreira de treinador. É o quarto com mais jogos na 1.ª divisão nacional (573, atrás de Fernando Vaz 626, Manuel de Oliveira 617 e Jorge Jesus 603) e é ele o mentor do primeiro Boavistão da história, do arrebatador Vitória FC europeu e do FC Porto bicampeão nacional naqueles loucos anos 70. Antes disso, Pedroto é também um jogador de classe internacional, ao ponto de contabilizar 17 internacionalizações pela selecção A (uma pelo Belenenses, as outras 16 pelo FC Porto).

A 9 Agosto, o FC Porto anuncia a transferência-recorde de um jovem irreverente, com escola feita no Norte do país. Aos 18, entra nos juniores do Leixões, como médio. Basta um toque na bola para se perceber o seu talento, só que Pedroto gostava de dar mais, muito mais.

Tanto que, certa vez, frente ao Académico do Porto, pede a bola ao seu guarda-redes e vai por ali fora a driblar toda a gente até chegar à linha da outra baliza. Aí, marca de calcanhar, depois de puxar os calções para cima e de se pentear. É levado em ombros pelos colegas e o seu treinador (Armando Martins) dá-lhe uma descompostura tão grande sobre o futebol colectivo e não individual que Pedroto nunca mais repete a cena.

O serviço militar em Tavira obriga-o a continuar a carreira no Algarve. Escolhe o Lusitano Vila Real de Santo António, que, por capricho do destino, está na 1.ª divisão. É aliás aí que dá pela primeira vez nas vistas, com um golo de fora da área ao Sporting (2:0 para o Lusitano) que o inimitável guarda-redes leonino Azevedo considera um dos melhores da sua carreira.

Na época seguinte, o Lusitano desce de divisão e Pedroto, já sem serviço militar por cumprir e sem ordenado (só recebe por jogo: 100 contos por vitória, 60 por empate e 20 por derrota), opta por viver em Lisboa, ao serviço do Belenenses, que lhe oferece 25 mil escudos por mês. Um director do FC Porto ainda lhe dá um cheque de 80 contos para a mão mas Pedroto não quer voltar atrás na palavra.

Nas Salésias, Pedroto está bem instalado, a ganhar bem, com um emprego estável na Hidro-Eléctrica do Zêzere, e a jogar enormidades. Com naturalidade, é chamado à selecção (0:3 vs França em Paris, a 20 Abril 1952), juntamente com outro belenense, o defesa Serafim, capitão de Portugal. O seu físico acompanhado de uma técnica apurada é garantia de sucesso.

Por isso, o FC Porto volta à carga e Pedroto contra-ataca a esta investida com números astronómicos: ou 150 contos por mês ou nada. E o FC Porto responde na mesma moeda: 335 contos para o Belenenses e 165 para Pedroto, num total de 500. Com tanto escudo, Pedroto acaba de se tornar o jogador mais rico de Portugal, na (também) transferência mais cara de sempre no país.

Quando arruma as chuteiras em 1960, na sequência de uma época em que é afastado por Bela Guttmann do onze titular, Pedroto abraça a carreira de treinador e vai tirar um curso organização pela Federação Francesa de Futebol. Sai de lá com nota máxima, um 20, e é contratado pela Federação Portuguesa de Futebol para treinar os juniores.

Na primeira experiência, e ajudado pelo seleccionador David Sequerra, então jornalista do Mundo Desportivo, a carreira de Pedroto também recebe nota 20. Portugal é campeão europeu sub18 em Maio 1961, a escassos dias do primeiro título europeu do Benfica (3:2 vs Barcelona em Berna). Na final, quatro golos de Serafim derrubam a Polónia, no Estádio da Luz.

O que se passa depois dessa alegria, e até ao dia da sua morte a 8 Janeiro 1985, é uma aventura dos sentidos, prova de que Pedroto tem realmente olho para o futebol tal a capacidade para transformar a vida desportiva de algumas equipas e alterar o panorama futebolístico do país. Antes das quezílias com Benfica e Sporting, o homem é notícia de primeira página com a nota 20 no tal curso em França. O seu trabalho, elogiado por todos os professores e lido por todos os alunos, engloba 17 mandamentos. Ei-los.

1 O possuidor da bola manda no jogo

2 O jogador sem bola

3 Espaço livre

4 O jogador sem bola procura-a

5 Correr à direita, correr à esquerda e vice-versa

6 Passar e prosseguir na acção

7 Ir ao encontro da bola

8 Progressão em dribling

9 Triangulação

10 Procurar o jogador lançado

11 Valor da superioridade numérica

12 Passar com rapidez do ataque à defesa e vice-versa

13 Antecipação

14 Todos ao ataque, todos à defesa

15 Mudança de ritmo

16 Estado de alerta permanente

17 Jogar justo

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