Great Scott #577: Último jogador da 1.ª divisão irradiado em Portugal?

Great Scott Mais 07/05/2022
Tovar FC

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Great Scott #577: Último jogador da 1.ª divisão irradiado em Portugal?

Carlos Alberto Freire

Mil-nove-e-sessenta-e-nove, os campeões da 2.ª divisão anunciam-se em dois domingos seguidos. No dia 13 Abril, o Barreirense ganha 3:0 vs Sesimbra no D. Manuel de Melo e aproveita a derrota do Torreense em Almada para se sagrar vencedor da zona sul, a uma jornada do fim. No dia 20, o Boavista despacha o Espinho no Bessa por 4:0 e fecha a zona norte com um ponto de vantagem sobre o Famalicão.

Passa-se mais uma semana e é a vez de Barreirense e Boavista esgrimirem argumentos no Bonfim para levar o título da 2.ª divisão. O Barreirense entra melhor e marca por Eusébio. O Boavista reage com categoria e dá a volta por Leitão mais Zeca Pereira. No reinício, o Boavista acentua o seu domínio e ainda atira duas bolas à trave, através de Taí e Lemos (canto directo). Contra a corrente do jogo, o Barreirense faz 2:2 em cima do minuto 90, por Candeias, de livre directo.

Vamos para prolongamento e é o Boavista dá um ar da sua graça com o 3:2 de Germano num lance em que o defesa Faneca e o guarda-redes Bento (esse mesmo) se atrapalham. O Barreirense vai atrás do resultado mais uma vez e consegue o 3:3 por Mira, de penálti a castigar falta sobre Valter. Os boavisteiros protestam airosamente e o árbitro Décio de Freitas é obrigado a mostrar a autoridade à base de uns quantos chega-para-lá.

Como o regulamento ainda não permite desempate por penálti nem lançamento da moeda ao ar, é necessária uma finalíssima. A FPF marca para o outro domingo, 4 Maio, em Coimbra, às 11 horas, com arbitragem de Aníbal de Oliveira. O Boavista festeja o primeiro golo matinal, por Taí, aos 12’, de cabeça, na sequência de um canto. O Barreirense vai para a frente e encontra o caminho do empate através de Eusébio, aos 33’, em recarga a uma bola largada pelo guarda-redes Quim.

A abrir a segunda parte (47’), José Carlos desfaz o nó e desequilibra a balança a favor do Barreirense num golo altamente contestado pelos boavisteiros. O número 9 empurra a bola junto à linha de golo num molhe de jogadores todos engalfinhados. Há quem saia a festejar, há quem proteste veemente. Bola ao meio e tudo de volta à normalidade. Até ao fatídico minuto 85.

Ataque do Barreirense pela direita e falta de Lemos sobre Mira e o árbitro internacional dá ordem de expulsão. O que se segue é uma confusão inconcebível, fruto de um desnorte. Lemos protesta junto de Aníbal de Oliveira, colado ao bandeirinha Oliveira Pinto, do lado do peão, e passa dos protestos gestuais para a agressão verbal. Muitos outros jogadores seguem o mesmo caminho e, às tantas, o médio brasileiro Carlos Alberto Freire dá um pontapé no árbitro. Aníbal de Oliveira só se livra de mais pontapés e murros numa correria desenfreada pelo campo. É vergonhoso e, ao mesmo tempo, embaraçoso.

No meio daquela confusão, e já serenados os ânimos, Aníbal de Oliveira expulsa o lateral-direito Fernando por tentativa de agressão – ainda não se chegara à conclusão de que Carlos Alberto Freire fora o agressor. O boavisteiro, inconformado, tem de sair do relvado agarrado por quatro companheiros, um em cada extremidade do corpo, qual criança mimada, a contorcer-se toda. Os últimos cinco minutos jogam-se em 11 contra nove a um ritmo pachorrento para evitar mais chatices e o Barreirense segura o título de campeão da 2.ª divisão.

A piada (salvo seja) disto tudo é o discurso dos treinadores no final do jogo. António Gama, do Boavista: ‘Foi triste, muito triste. O critério de deixar jogar daquela maneira cria no espírito dos jogadores facilidades que nós, homens da bola, sabemos que são fictícias. A vitória assenta bem ao Barreirense pelo que fez no segundo tempo.’ Já Manuel de Oliveira, do Barreirense. ‘Podíamos ter marcado mais um golo, mas o Boavista é uma boa equipa e valorizou a nossa vitória num jogo com uma fase final deplorável porque Aníbal de Oliveira não soube ter os jogadores na mão.’

Claro, a notícia deixa de ser a entrega da taça e passa a ser o sururu inqualificável. Nem 72 horas depois, o Conselho de Disciplina da FPF reúne-se e decide irradiar Carlos Alberto Freire por agressão ao árbitro. Além disso, Lemos apanha nove jogos de castigo, Fernando oito e Alfredo cinco. Quanto a Aníbal de Oliveira, já com a apreciável idade de 50 anos, abandona a arbitragem nessa manhã inglória, ao fim de 49 jogos na 1.ª divisão e 13 internacionalizações pela UEFA.

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